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O Espaço é Seu

O que faz um filme ser bem dirigido? (Caio Rubini)

25.09.17

O que faz um filme ser bem dirigido? Essa pergunta é difícil mesmo pra quem conhece o riscado. Qualquer filme começa com um roteiro. Mesmo que esse roteiro não esteja fisicamente no papel e tenha apenas uma linha. A partir daí, tudo é responsabilidade do diretor. A ideia do filme, portanto, não é. Ele pode lapidar a ideia, pode melhorar as cenas criadas para ilustrar a ideia, mas a todo-poderosa ideia, o cerne do filme, essa o diretor não pode mudar.

Sempre comparo escrever um roteiro e dirigir um filme a matar alguém e descobrir quem o matou. Escrever, pra mim, é como um assassinato. É preciso sangue frio. As possibilidades são infinitas. Quem vai morrer, onde, de que forma, por qual motivo e em quanto tempo. É arbitrário. Dirigir, no entanto, é investigar. É descobrir quem morreu, onde, de que forma, por qual motivo e em quanto tempo. É pensar com a cabeça do assassino, é buscar a verdade custe o que custar. Não há um caso a ser revelado se não houver crime. Não há um filme a ser feito se não houver roteiro.

O lance é que do papel até o HD é uma saga. Cacá Diegues fala que a arte audiovisual é a única forma de arte na qual o que se entrega é o rascunho ao invés da obra pronta. E o diretor é o responsável por guiar sua equipe para tentar chegar ao resultado mais próximo do que foi planejado. Vender sua visão pra todos que vão executá-la. (Alejandro González) Iñarritú decidiu filmar “Revenant” em locação ao invés de estúdio não só pela realidade do cenário, mas também pela dificuldade que seria imposta aos atores mesmo quando não estivessem em cena. Christopher Nolan decidiu colocar uma câmera Imax (você já viu o tamanho de uma?) presa a um avião pra filmar algumas cenas de “Dunkirk” porque achou que não conseguiria resultado similar em pós-produção. É fundamental confiar na visão do diretor, mesmo que nela se revele o caminho mais difícil. E quando o diretor estiver no set, de acordo com (Christopher) Nolan, “ele deve esquecer onde está e a quantidade de dinheiro envolvida para fazer o filme acontecer e ser implacável na busca da imagem que vai fazer a história ir pra frente, assistindo cada plano com a crueldade de uma audiência que está acostumada a ter tudo e não faz ideia da dificuldade que é fazer um filme”.

No último dia 11 de setembro saíram os vencedores do Clio Awards 2017, do qual fiz parte do júri de Direction e Cinematography, categorias técnicas de filme. Esse júri aconteceu online, sem espaço para debates ou reações que poderiam influenciar a votação. E existe um fator subjetivo em cada avaliação. Às vezes nos identificamos mais com um personagem específico ou existe um tema que nos toca de uma forma especial (não me faça ver filmes de pais e filhos).

O objetivo do júri, no entanto, deve ser o de estar em dois lugares ao mesmo tempo: imerso na experiência do filme e distante dele. Pra conseguir avaliar da maneira mais profissional possível o trabalho do detetive daquele crime em questão. O interessante é que trabalhamos com a emoção. Cinema é emoção. A melhor fotografia não é o filme mais bonito. (Jackson) Pollock e (Jean-Michel) Basquiat não seriam grandes artistas não fosse a energia de suas pinceladas. A beleza da arte desses dois pintores não está no valor estético de seus quadros, e sim na sensação que suas obras causam. Os melhores fotógrafos estão interessados, acima de tudo, na sensação que o registro cinematográfico da história vai causar na audiência. E ao ver os filmes premiados, percebo que todos eles têm uma coisa em comum. Eles te jogam as leis da física na cara. Você não consegue se distanciar. Você é puxado pra dentro da história como a vítima que é traída por sua curiosidade. Você entra no filme e se emociona. E esquece de todo o resto.

Caio Rubini, diretor na Hungry Man

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