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O espaço é seu

Essa tal de reciprocidade (Sergio Mugnaini)

18.02.19

Essa tal de reciprocidade

Confesso que estou quase conseguindo virar um cidadão baiano depois de 18 anos casado com uma baiana. Como de costume, as férias de janeiro são em Salvador e deduzi que, cada vez que vou, aprendo um bocado. Aprendo a dar com pau. A pronto e à hora. À toa. A porra toda. Frequentando um abaixadinho aqui e outro ali. Descobrindo o significado de cangalha. Cantipora. Do baiano soltar uma gaitada. E descubro que o baiano adora uma reciprocidade.

Outro dia, estava no show de Maria Betânia & Zeca Pagodinho na Concha Acústica do TCA e, minutos antes do espetáculo, uma agitação se deu na plateia: é Caetano! Não no palco, ali mesmo, do nosso lado. De mansinho, ele chegou e sentou na arquibancada para ver a sua irmã cantar. Isso é reciprocidade, rei. O respeito pela irmã que entra momentos depois e dá um show incrível. Se não bastasse Caetano, eu conheci Preta, em seu restaurante na Ilha dos Frades. Um restaurante da porra. Preta é do tipo que se você der ousadia, ela te conquista pelas histórias, pelo café que manda trazer na mesa rapidinho e pelos doces que a criançada se mata de comer. Afinal, reciprocidade é a “capacidade intelectual” por meio da qual se torna compreensível a relação entre duas pessoas. E baiano sabe como fazer isso.

Tenho a sensação de que essa reciprocidade se espalha através do dendê. São as baianas do acarajé que cuidam dessa parte. Então, me peguei exercitando essa tal de reciprocidade comendo um acarajé e acabei não resistindo, roubando uma foto da baiana. Por um segundo, um estranhamento. No segundo seguinte, quando disse que ela era muito dada (muito simpática em baianês), roubei mais um sorriso. E mais uma foto. Não é que essa tal da reciprocidade funciona?

Agora, de volta ao trabalho, acredito que o mercado está precisando de reciprocidade. Neste momento, estou falando menos sobre o mercado como um todo e mais sobre os jovens que atuam nas empresas, começando suas carreiras. Estou cada vez mais convicto de que os novos talentos querem e precisam de conselhos. Às vezes, até de uma dura. E reconhecimento? Eu experimento fazer isso, pois não são só eles que vão se sentir mais motivados, mas eu também. Afinal, reconhecimento é a melhor forma de estimular alguém. Parafraseando o filósofo Mário Sergio Cortella, “o salário hoje em dia não é a principal fonte de insatisfação dos brasileiros dentro das empresas. Mais do que uma remuneração condizente com o que seria justo pelo seu trabalho, as pessoas querem ser reconhecidas e valorizadas dentro das organizações”.

Devo reconhecer que os jovens têm uma energia da porra. Eu vejo que algumas empresas estão começando a aprender a lidar com essa energia, preparando seus gestores para que acolham a nova geração como um “patrimônio” e não como um simples trabalhador. Porque quando se acolhe a nova geração como um “recurso”, ao invés dela ser o “sangue novo”, se torna algo perturbador. E é claro que não é só o jovem que tem de se preparar para essa condição. Eu também me preparo para que a recepção seja acolhedora, tentando ao máximo ter uma postura de “humildade pedagógica”.

Um pouquinho de reciprocidade não faz mal a ninguém. Acredito que cada gestor que está sendo capacitado pelas grandes empresas deve saber que, sem dúvidas, vai aprender muito com os jovens. Pois eles chegam com novas habilidades muito valiosas para as corporações e necessitam de pessoas capazes de entendê-los para ajudá-los a encontrar os seus caminhos. Reciprocidade é não ter medo do novo. É não ter medo de contratar alguém mais novo do que você (que provavelmente vai querer roubar o seu lugar). É ter sabedoria para pensar a favor do próximo. E assim alcançar realizações pessoais e profissionais exponenciais.

por Sergio Mugnaini - Diretor Executivo de Criação, DPZ&T

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