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O espaço é seu

Passado e presente em filmes de composição (Marcelo Presotto)

19.05.14


Faz 12 anos, eu acho, me chamaram para dirigir uma campanha na DPZ. Até então, eu só trabalhava como motion graphics designer ou video designer, como chamavam na época, sob a tutela de outros diretores.



A campanha continha vinhetas para um festival de artes patrocinado pelo cigarro Carlton. Na época, fiquei na dúvida, mas decidi aceitar o desafio. Hoje, não faria, por um motivo pessoal: meu pai morreu de efizema pulmonar.



As vinhetas exibiriam letreiros animados e o diretor de criacão da DPZ na época, Carlos Silvério, me passou o briefing e mostrou umas pranchas lindas com o layout. Morri de medo. Quem disse que eu saberia animar e criar aqueles letreiros? Na época, eu me vendia como animador/designer e nem mexia no Photoshop. Gostava era de fazer colagem com materiais captados de diferentes formas.



Fingi autoconfiança na reunião e fui embora para pensar no que fazer. Nunca tinha entrado em uma agência, muito menos em uma do porte da DPZ, mas agora não dava para amarelar.



Então, decidi filmar quase tudo. Peguei letras diferentes de anúncios já existentes, recortei, colei, fiz móbiles, joguei na água e filmei com uma VHS. Depois, contratei um bailarino e filmei o cara dançando no pior fundo croma que já vi na vida. Roubei imagens de livros (stock shot era uma fortuna e nao tinha internet, como agora) e até frames de um clipe da Madonna. Joguei tudo no After Effects e misturei o máximo possível, para descaracterizar.



Vinte e cinco dias de trabalho e chegou o dia da apresentação. Estava morrendo de medo, claro. Exibi as vinhetas uma vez. Aquele silêncio. Achei que tinham odiado. O Carlos Silverio, então, disse: "Presotto, isso não tem nada a ver com o briefing que eu te dei, mas ficou tão bonito que eu não tenho o que falar!'.



Hoje, eu percebo o quão sensacional foi essa atitude dele e como era muito mais divertido trabalhar com publicidade e Motion Graphics.



Doze anos depois, me chamaram para dirigir uma campanha de Smirnoff Flavors, na JWT. Nos layouts apresentados pela agência, um homem trafegava por mundos lisérgicos dependendo do sabor da vodca experimentada. A diferença é que agora eu sabia muito bem a importância de seguir um briefing e deixar bem claro qual seria a interpretação visual do conceito. Afinal, no caso de reprovação, não estavamos falando de simplesmente pegar de novo a câmera VHS e chamar um bailarino sem agente pra filmar contra um pano verde esticado em um pequeno estúdio.



No caso de Smirnoff, a liberdade para traduzir o conceito visualmente foi generosa, porém, é claro, cercada de uma visualização precisa e pré-aprovada. O que foi similar ao outro trabalho foi a expectativa dos criativos de que eu resolvesse o trabalho com pós-produção.



Segui a mesma intuição do Carlton Arts e resolvi filmar quase tudo, ao contrário do que se esperava. Todos os cenários foram reproduzidos ao vivo e no estúdio. Minha decisão veio pela certeza de que, em um filme tão estético, o melhor resultado, tanto para fotografia como para a arte, seria trabalhar com cenários reais. O fato de cliente e agência já verem no set 80% do resultado visual, tranquilizou as expectativas e tornou o trabalho muito mais agradável. E o cronograma ficou mais leve. Lá no Carlton, tinha um mês; aqui, 10 dias para a pós.



Anos atrás, o Silvério teve, para minha sorte, uma agradável surpresa e eu pude exercitar a criatividade no escuro e com todos os riscos que isso implica. Fico feliz por, tanto tempo depois, eu ter podido experimentar a mesma liberdade criativa, embora com os riscos minimizados.



Aqui você espia o resultado de Carlton e aqui, o de Smirnoff.

 



Marcelo Presotto, diretor





 


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