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O espaço é seu

O dia em que ganhei um Leão

03.08.07

Mercúrio Retrógrado


Recebi a ligação dizendo que eu tinha ganhado o Leão na segunda-feira, 18 de junho, à noite. A entrega do prêmio seria na quarta-feira, 20, às 19h, em Cannes. Meus documentos não estavam em ordem e era praticamente impossível organizar em apenas um dia. Mas a vontade de receber o prêmio era tanta, que resolvi tentar assim mesmo. "Vai que..." era a frase que mais martelava na minha cabeça. Este foi o início da minha aventura.


Reservei a minha passagem para terça às 16h30. No dia seguinte, acordei às 4 da manhã e começou a correria.


Eu precisava imprimir um documento, mas minha impressora quebrou bem na hora. Fui numa gráfica, mas tinha uma fila enorme de documentos para imprimir na minha frente. Então, fui numa Lan House. Quando chega na minha hora de imprimir, a máquina quebra. Finalmente consegui em outra gráfica que me indicaram. Tive um monte de outras coisas para resolver, e perdi tanto tempo que não consegui pegar o vôo das 16h30. Liguei para a secretária do meu chefe e pedi para ver se tinha um vôo mais tarde. Tinha o das 19h20 para Paris e uma conexão mais tarde para Nice. Ou seja, eu chegaria em cima da hora no Festival se mais nada desse errado. Mudei a passagem para o vôo das 19h20.


Indo para o aeroporto, peguei um trânsito intenso na marginal. Mas cheguei a tempo de sacar, trocar dinheiro, fazer o check-in e embarcar.


Entrei no avião e estava tudo pronto para decolar, quando o comandante avisa que devido a problemas da Infraero teríamos um atraso que poderia durar até quatro horas. Ficamos lá, desesperados. Os outros passageiros porque iriam perder a conexão, e eu porque iria perder a entrega do prêmio em Cannes. No meio de tanta preocupação, acabei ficando amigo das pessoas no avião. Duas mulheres ficaram torcendo por mim e me deram até o e-mail para que eu dissesse mais tarde se cheguei a tempo da premiação ou não.


Depois de quatro horas e meia, decolamos. Cheguei a Paris às 15h00. Mas, devido ao atraso, perdi o vôo para Nice, e como a passagem tinha sido comprada separada e não como uma simples conexão, eu tinha que pagar uma multa e fazer a transferência do lado de fora do aeroporto, no balcão da Air France. Ou seja, tinha que sair pela imigração. A moça da TAM que estava me ajudando não podia me acompanhar ou não poderia entrar de novo, então me explicou tudo e disse para eu tomar cuidado para não me perder. Adivinha? Assim que saí da imigração já estava perdido sem saber para onde ir. De repente sinto um toque no ombro, olho para trás e é a moça da TAM. Ela me diz: “Eu sabia que você ia se perder, precisava te ajudar. Depois me viro para entrar de novo. Vamos lá que vai dar certo, você tem que pegar seu prêmio em Cannes.” Eu não acreditava. Ela também me passou o e-mail para saber o resultado da minha correria.


Chegando ao balcão da Air France, outro contratempo: o próximo vôo para Nice só saía às 19h, a hora em que começava a cerimônia. Mas, lógico, fui mesmo assim. Cheguei a Nice umas 20h30 e, por sorte, eu estava com uma mala pequena e não precisei despachar, então chegando lá fui direto pegar um taxi. Disse para o motorista: “S’il vous plait, go to Palais. Fast please, fast!!!!” No caminho troquei de roupa e liguei para o Sato (meu ex-dupla que ganhou o Leão comigo), que disse: “Cara, voa, que ainda não chamaram a gente e a premiação está acabando, se você der muita sorte chega a tempo. Mas voa. Vou deixar seu convite lá na porta com um segurança.” Fui enchendo o motorista do taxi gritando “FAST, vai, FAST!!” O francês passou até no farol vermelho pra me ajudar. Quem disse que francês não é gente boa?


Cheguei ao Palais finalmente. Subi a escadaria gritando aos seguranças: “- I am André Gola. Please, I need my invitation because I have won a Gold Lion.” E nada dos seguranças me deixarem entrar. É, tem francês que não é gente boa. Então, tentei dar um migué: voltei lá para baixo, abaixei a cabeça, subi novamente e fui entrando como quem não quer nada. Mas, claro, fui barrado novamente. Fiquei desesperado, liguei para o Sato e ele disse que não podia sair, pois estavam prestes a chamar a gente naquele momento. Fiquei doido. De repente, aparece lá na porta a Roberta, esposa do (Guilherme) Jahara, com um convite na mão, gritando aos seguranças para me deixarem entrar. Eles deixaram, então subi correndo, entrei, sentei e em menos de 5 minutos nos chamaram. Aliviado, levantei para subir no palco e receber o prêmio, comemorando: “Eu cheguei!!!!”


Deu certo. Cheguei a tempo. Foi uma vitória. Tão grande quanto ter ganhado o Leão. Foi demais. Até agora não acredito nessa história. Mas está registrado, aqui e na minha cabeça, cada momento e a lição de que sempre temos que acreditar e tentar. Sempre, em tudo na vida. E olha que eu nem li “O Segredo”.


PS: Para você que não entendeu o título do texto: quando cheguei, contei a história para a minha dupla Carla, ao que ela disse: com tantos contratempos, Mercúrio só pode estar retrógrado. Fomos pesquisar na internet e, realmente, o planeta Mercúrio estava retrógrado. Segundo a astrologia, um planeta está retrógrado quando dá a ilusão de que está “andando para trás”. Quando é Mercúrio que está retrógrado, parece que os assuntos não andam. Surgem contratempos, atrasos, há mais engarrafamentos que o normal, computadores e máquinas apresentam mais falhas que o usual, muitos imprevistos aparecem. Dessa vez, parece que a astrologia acertou.

André Gola, diretor de arte da Leo Burnett, premiado com Ouro em Cannes por campanha impressa criada na Publicis para o Mackenzie


Comentários

Creyson - Goleta, faltou você explicar como tirou um passaporte em um dia.


Mega - Gola, resta uma dúvida: as moças que pegaram seu email no avião já entraram na comunidade "admiradoras de André Gola" no Orkut?


 Mussum - Esse picareta é meu ídolo.

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