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O Espaco é (meu)

Eu não nasci feminista (@thaicorsi)

15.12.17

Eu não nasci feminista. Cresci numa escola de freiras onde as mesmas pediam pra gente não usar bermudas muito curtas pra não provocar os meninos. Acho que boa parte da minha geração cresceu acreditando que tínhamos que nos dar valor, se não a gente não encontraria ninguém pra casar. Eu era aquela pré-adolescente preconceituosa que me incomodava com meninas que eram muito amigas dos meninos, que ficavam com vários, acreditava que eram oferecidas e não se davam respeito. Bom, posso dizer que eu mesma as desrespeitei bastante. Eu queria nunca ter aprendido a palavra “vadia”.

Depois toda menina passa pela fase “sexy” na adolescência, pq era assim que a sociedade e a TV diziam que era legal pra atrair os caras na balada, ou mesmo pra se sentir feminina e mais bonita que as outras meninas, afinal, competição! Não se pode confiar em mulher nenhuma, é o que a sociedade (e a mídia) continuam impondo. Tudo é culpa da mulher.

Entrei na faculdade sem muita personalidade formada e muita informação mal formulada. Lá comecei a ver muitos professores dando em cima de alunas, e continuei achando que eram elas que estavam dando mole ou sendo oportunistas. Um dos primeiros empregos que tive, me deparei com um colega de trabalho que fazia piadas que me deixavam muito desconfortável, e por algum motivo eu achava que era eu que estava indo com a roupa errada ou fazendo algo errado no trabalho, e por isso ele me atormentava.

Lembro também da vez que engordei e fui excluída, sofri bullying por aqueles “caras legais” da criação que não admitiam atendimento que não fosse gostosa. Acho que a maioria também já passou por algum chefe direto que manipulava emocionalmente e fazia a gente achar que nós que estávamos misturando as coisas. Ou então aquele típico criativo que quer te cobrar uma cerveja antes de entregar aquele job que você precisava pra ontem.

Em todos esses momentos da minha vida, nossa cultura me fez acreditar que era eu que estava errada, eu que estava fazendo algo errado e confundindo as pessoas. Precisei de muita leitura, muito auto conhecimento, muitas conversas e pessoas certas que também se viram na mesma situação para que eu chegasse à conclusão de que, peraí, mas todo mundo passa por isso, então não sou eu que estou ficando louca, tem algo muito errado por ai que tem feito o mundo acreditar que a culpa é sempre da mulher “manipuladora não confiável”. Pior ainda se você for imigrante, mãe, gay, negra, ou simplesmente “durona”.

Demorou, mas hoje eu sei muito bem diferenciar o certo do errado sem sentir que estou ficando louca ou confundindo as coisas. Estou morando há mais de 1 ano fora do Brasil e, mesmo ainda na busca de emprego, já estive de novo na situação em que o homem tentou usar seu cargo de poder para conseguir algo, e quando não conseguiu, tentou me fazer passar por louca. Por ironia do destino, 2 semanas antes eu havia feito uma pesquisa online pra colher depoimentos de mulheres que sofreram algum assédio na vida ou no ambiente de trabalho para um projeto pessoal, e quase chorei com os resultados que obtive.

Frustrante, mas não vamos mais ficar caladas, nunca mais.

Sou muito orgulhosa por ter essa raiva interna sendo expressada por justiça. E ter mulheres no mundo que estão se unindo pra acabar com isso me faz acreditar ainda mais que ainda “tem jeito”. Então, não venham me falar que mulher compete com outras mulheres, porque essa fase já passou, e, como diz uma amiga minha: ou entra agora no barco ou você vai afundar, porque não tem mais volta.

Ninguém nasceu feminista, pelo menos não até agora. Mas podem ter certeza de que quem está vindo agora já está aprendendo como as novas regras funcionam.

Depende de nós, mulheres, nos unirmos e mudarmos isso.

Nunca é tarde. Eu mesma entrei tarde nesse barco, mas aprendi e entrei a tempo.

E vocês homens, por favor, aprendam, respeitem e apoiem. #grlpwr

Thaiane Corsi Garcia Luglio, Estrategista Freelancer, feminista e ouvinte para quem precisar

thaiane89@gmail.com

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