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O termo Brandformance deve ser abolido do vocabulário (Pedro Campos)
Toda indústria cria seus modismos. No marketing, eles aparecem em ciclos curtos, prometem o mundo e vão embora deixando pouco além de um vocabulário inflado. Esse é o caso do “Brandformance”. A palavra, supostamente, representa a união perfeita entre construção de marca (branding) e vendas (performance). A promessa seduz porque parece resolver a tensão que todo mundo que trabalha com marketing enfrenta. De um lado, o time de finanças cobrando um resultado amanhã e do outro o time de marca sonhando com o longo prazo e pedindo mais calma, “uma hora vai dar certo”.
A origem do termo é nebulosa, mas a lógica por detrás é fácil de rastrear. Com a digitalização da mídia, qualquer peça passou a ter métricas em tempo real. Plataformas como Google e Meta construíram todo um discurso de funil completo. O marketing digital rapidamente adotou essa prática e estabeleceu um comportamento ritmado para o consumidor, como se ele assistisse a um comercial de marca na quarta e clicasse no anúncio de compra na quinta.
As consultorias aproveitaram a onda e publicaram matérias mostrando ganhos de eficiência quando a mesma campanha trabalha alcance amplo e chamada para ação. Um estudo da WARC em parceria com o Google, intitulado de “Beyond the Horizon – The Holistic Path to Measuring Media Investments”, concluiu que ignorar a parte de topo/médio funil reduz o ROI total em até 50%. O argumento principal diz que, se a mesma peça emociona e vende, a empresa economiza verba, acelera o funil e prova valor mais depressa. Além disso, o termo ajuda quem precisa dialogar com o financeiro. Em vez de falar em “branding”, que muitas diretorias ainda leem como custo, surge uma palavra que carrega o sufixo “formance”, lembrando performance, mensuração e payback. Há ainda uma questão de estrutura organizacional. Equipes de branding e de growth muitas vezes trabalham em silos, usando métricas, prazos e referências diferentes.
Assim o “Brandformance” chega como um idioma neutro, no qual todo mundo poderia conversar, conciliando métricas de recall espontâneo com custo de aquisição. Tudo no mesmo dashboard.
Acontece que dar um novo rótulo para a mistura de reputação de marca e venda é como anunciar, em 2025, que você descobriu a inteligência artificial.
Em 1880, John Wanamaker, dono da primeira grande loja de departamentos da Filadélfia, comprou o primeiro anúncio de página inteira em um jornal norte-americano, unindo histórias de produto a ofertas agressivas. Mesmo sem dashboards, ele exigia prestação de contas da propaganda e reconhecia: “metade do dinheiro que gasto em publicidade é desperdiçado; o problema é que não sei qual metade”.
Naquela época, John procurava investir em campanhas institucionais para reforçar a sua credibilidade e adotava políticas de devolução garantida para criar diferenciação para a sua loja. O empresário combinava construção de confiança e venda imediata antes de qualquer sigla moderna. A lição permanece: reputação e performance sempre caminharam juntas — mudamos apenas o termo, não o princípio.
Se “brandformance” soa revolucionário, é porque estamos sofrendo um apagão de memória e aceitamos reembalar um princípio básico, tratando-o como insight inédito. O marketing não precisa de uma palavra para lembrar seu propósito original. Precisa apenas não o esquecer.
O estudo The Long and the Short of It, de Les Binet e Peter Field, mostra que a combinação de investimento que maximiza lucro, em média, é alocar cerca de 60% do orçamento em atividades de marca e 40% em ativação de vendas. A lógica é simples: campanhas mais abertas e emocionais ampliam a base de compradores futuros, enquanto ações táticas capturam a demanda já existente. Cada objetivo exige estilos diferentes de mensagem, segmentação e mensuração e, portanto, objetivos distintos não cabem na mesma peça criativa. Construir marca requer alcance amplo, frequência adequada e ideias que gerem memória. Performance exige segmentação fina, ofertas claras e otimização constante de taxa de conversão. Misturar esses dois modos num único anúncio costuma resultar em falta de foco: a peça perde potência emocional e não oferece incentivo suficiente à ação.
Há quem diga que a construção de marca demore para dar resultados, logo, precisamos de algo que produza vendas enquanto o equity se consolida. No entanto, campanhas de marca eficazes geram efeitos desde as primeiras horas. Não necessariamente em vendas diretas, mas em sinais concretos, como salto de buscas pelo nome da empresa, aumento de tráfego orgânico e queda no custo por clique de outras campanhas, por exemplo. Se esses ou outros indicadores não se mexem, provavelmente a mensagem falhou e não existe razão para esperar que, por magia, ela comece a funcionar daqui a doze meses. Existe uma correlação direta entre curto e longo prazo, assim como é impossível construir o segundo andar de uma casa sem o primeiro andar.
Adotar “brandformance” como solução única embaralha essa clareza. Primeiro, porque incentiva o uso de métricas híbridas de pouca utilidade. Segundo, porque ignora que times continuam divididos em silos. Pregando integração sem alterar processos, o termo cria mais frustração do que harmonia. Terceiro, porque pode levar as equipes criativas a tentarem conciliar emoção profunda com apelo promocional barato na mesma frase, produzindo peças sem alma e sem apelo comercial.
O objetivo dos profissionais de marketing é gerar lucro. O marketing bem feito resulta em construção de marca e geração de receita. Mas é preciso fazer isso com disciplina estratégica: objetivos claros, peças específicas, orçamentos proporcionais ao papel de cada fase do funil e uma mensuração que respeita a natureza de cada métrica.
“Brandformance” não oferece método nem teoria nova; apenas renomeia boas práticas antigas e, no processo, cria a ilusão de que basta criar uma palavra para resolver um dilema clássico. No final, o problema da marca não é a falta de integração entre branding e performance. É a falta de estratégia.
Inventar nomes sempre parece mais fácil do que enfrentar problemas estruturais de segmentação, criatividade e accountability de métricas. Mas, os modismos passam e marcas que crescem de maneira sustentável são construídas por gente que domina os fundamentos com maestria.
Pedro Campos, fundador da Marketing de Ponta a Ponta
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