arrow_backVoltar

Colunas CCSP 2014

TED Global 2014, Rio de Janeiro (por Lucas Mello)

20.10.14


Você, publicitário, não faz ideia do poder que tem em mãos. Devem ser os anos vendendo sabonetes, cerveja, carros de luxo e tênis de corrida. Ou então as 10 temporadas seguidas na riviera francesa e as intermináveis palestras fazendo propaganda de como propaganda pode se transformar em melhor propaganda. Mas a boa notícia é que tudo isso que você tem passado na verdade te deu um poder que provavelmente ainda não conhece direito.



Resolver briefings incompletos para clientes cheios de exigências e limitações é como um treinamento de guerra. Você vive situações extremas para, quando chegar a hora da verdade, conseguir desempenhar seu papel com muito mais tranquilidade, precisão e eficácia. E, acredite, você tem uma das ferramentas mais valiosas em suas mãos.



A propaganda sempre foi uma arma poderosa para mudar comportamentos em massa, transformar culturas e inserir novos padrões éticos e estéticos no mundo. E nem sempre de forma construtiva. Antes de servir aos carros de luxo, serviu à igreja, ao Hitler e ainda serve a figuras estranhíssimas como Kim Jong-un que, acreditem, consegue através da propaganda fazer seu povo acreditar que está absolutamente tudo certo com a Coreia do Norte. E você ainda tem dúvida do poder que tem nas mãos?



Jose Miguel Sokoloff não tem. Ele usou seu poder para desmobilizar centenas de jovens de um dos grupos guerrilheiros mais violentos do planeta: as FARC. Mas Jose não é militar, ativista ou membro das Nações Unidas. Ele é, na verdade, executivo de criação da LOWE da Colômbia. É publicitário igual a mim e a você. E não por acaso foi também presidente do júri na categoria Outdoor de Cannes em 2014.



Para conseguir que jovens guerrilheiros desistissem do crime e voltassem às suas famílias durante o Natal de 2011, Jose e seu time criaram a ‘Operación Rios de Luz’. Utilizando os rios como mídia, colocou centenas de mensagens de famílias que perderam seus filhos para o crime dentro de pequenas bolas iluminadas que flutuavam rio adentro na Amazonia até chegarem aos acampamentos dos guerrilheiros. Isso ajudou a trazer centenas de jovens de volta para seus lares em pleno Natal. Transformou as vidas de algumas centenas de famílias.



Histórias como essa foram compartilhadas durante toda a segunda semana de outubro no TED Global, que aconteceu no Rio de Janeiro. O evento reuniu cerca de 1000 pessoas das mais diversas áreas de conhecimento. Destes, aproximadamente 200 brasileiros.



Dentre maravilhosas histórias neurocientíficas, como a de Miguel Nicolelis, discussões importantes sobre privacidade com Glenn Greenwald e narrativas heróicas de resistência dos direitos da mulheres no Paquistão, como a de Khalida Brohi, também tinham grandes exemplos de publicitários que utilizaram o poder da propaganda como ferramenta de transformação social.



Na plateia, infelizmente, essa importante mensagem não ecoava para algumas pessoas que ali deveriam estar. Poucos presidentes, sócios e líderes das grandes agências de propaganda do país estavam presentes. Perderam essa oportunidade única de serem inspirados por verdadeiras histórias de resistência e coragem. E também desperdiçaram a chance de conhecerem um pouco mais da sua responsabilidade no cenário de crise que vivemos e do potencial de transformação tremendo que têm em suas mãos.



Subir no palco do TED para contar suas histórias e seus cases deveria significar muito mais que chamar uma celebridade para o palco do Palais pra vender as capacidades de sua agência. Granhar prêmios é muito satisfatório, mas ganhar reconhecimento porque contribuiu de forma verdadeira para o nosso planeta ser um lugar um pouco mais habitável, amável e seguro deveria significar muito mais para nós publicitários.



É claro que todos os anos vemos milhares de campanhas de agências para ONGs, fundações e institutos, pelo mundo. Muitas delas sendo agraciadas com lindos leões dourados. Mas quantas dessas possuem a real intenção de ajudar e transformar? Quantas dessas tem a determinação de atingir os resultados da mesma forma que assumimos compromissos com nossos clientes para vender mais de seus produtos?



Vamos deixar de fazer campanhas fantasmas para institutos de câncer e usar essa mesma energia para tentarmos encontrar nosso propósito e a causa que nos move. Assim quem sabe um dia subir ao palco do TED para apresentar seu projeto irá valer mais que um Grand Prix no portfólio dos megagrupos de comunicação. Mas, pra isso, precisa haver um despertar de consciência. É preciso sair da Av. Faria Lima e entrar em contato com a vida real. E, acreditem, há muita coisa errada acontecendo nesse momento pelo mundo. E muita gente precisa de você.



Por Lucas Mello, CEO da LiveAd



Aproveite e leia também matéria sobre a palestra de Laura Jordan-Bambach no Festival do CCSP, batizada de "The dirt word", aqui.


Colunas CCSP 2014

/