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Criado-Mudo

O meu é nômade

05.10.07

Baixinho, pesado e muito companheiro. Herdei da minha mãe.
Que herdou da minha avó. Que herdou da minha bisavó. É, ele é velho, mas tá muito moderninho. Anda carregando filmes do Tarantino, guardando revistas Cult e um soro fisiológico pra aguentar esse tempo seco.


Quando estou muito chato, ele faz a gaveta emperrar, assim não
consigo abrir e pegar o livro do Garcia Marquez, e vou dormir mais cedo pra espantar o mau-humor.


Mas vou contar porque ele é nômade. Certo dia acordei em Sampa e o telefone celular tocou. Advinha, o celular estava em cima do criado. Recebi, ao lado dele, uma proposta e fui pra Floripa.
Ele veio junto, já que ouviu tudo e ainda tirou onda falando que queria curtir uma praia e virar surfista.


Tempos depois, a cena se repete. Telefone toca e, novamente ao lado do criado, outra proposta. Dessa vez eu fui pra Manaus.
Foi um desafio o criado se despedir daquela vizinha loira, surfista, a cara da Altenhofen. Que desperdício deixar ela pra trás.

Mas lá fomos e meu criado-mudo se apaixonou pelo ar-condicionado. Em Manaus, ele colecionava artesanato e cd's das bandas locais. Ficou triste e rancoroso depois que fui
visitar a floresta e não levei o coitado. Mas, como eu disse no começo, ele é velho e pesado, não acompanharia o ritmo da galera.


O mais bacana é que o criado guarda até hoje o melhor presente que ganhou da terra: um dvd, inteiramente nonsense,
do Festival do Minuto amazonense.

Quem ainda não viu, pense em Hermes e Renato, misturado com Monty Python e sotaque do Norte. É de chorar de rir.


Pouco tempo depois, exausto com o calor do Amazonas, ele me pediu e voltamos pra Sampa.

Mas, como o criado acostumou com essa vida agitada, agora está fazendo publicidade comigo aqui no interior. Esses dias descobri que ele só veio porque o Pinguim fica pertinho da agência e todo mundo aqui adora um chopp gelado.


Gabriel Ferrari - diretor de criação da Suave.

Comentários

Julio
- Um carioca em Ribeirão Preto - O criado mudo é um excelente tema! Totalmente fora do cotidiano, o criado mudo é atemporal. É um confidente. Segredos, história e apegos, confinados nas entranhas desse cúmplice do nosso escrúpulo de jogar o passado fora. Fotos de ex-namoradas, aquele número de telefone de 6 dígitos que não existe mais, escrito num guardanapo já amarelado, lembranças empoeiradas que revivem como Lásaro (ou seria com Z?). O criado mudo é um backup subversivo de nossas lembranças. O criado mudo, é mudo porque sabe demais. bagulhada@yahoo.com.br


Lucca - Caraca gabriel. você vai conhecer o brasil por meio da publicidade meu hahahaha ja já você escreve outra dizendo que lugar está. Imagino quantos amigos deve ter deixado nessa andança. parabéns meu velho, a coluna tá muito legal de se ler! lucca@gmail.com


 

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