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Eu e Jerry

por: Laura Esteves*

05.10.04

Até que enfim chegou o dia da filmagem do meu primeiro comercial aqui.


A estória toda é bem legal porque na verdade envolve um roteiro que eu fiz quando vim para cá em outubro, nas minhas férias, antes de ser contratada. O cliente é a cidade de Nova York e o briefing era trazer as Olimpíadas de 2012 pra cá. O problema só era o Rio também ser um dos principais competidores... Aí, eles falavam por aqui que eu ia colocar mensagens subliminares, tipo as cores verde e amarelo e a palavra Brasil, piscando no fundo.


Bom, a verdade é que eu fiz o roteiro e por uma dessas sortes danadas ele foi escolhido aqui dentro da agência, que levou pro cliente, que é o prefeito Bloomberg, que deve ter acordado num bom humor danado, que também aprovou.


Pra coisa ficar mais "grandiose" (aqui é tudo grande, XG, super size plus giga) eles sugeriram colocar uma celebridade, alguém bem New York City. E eu, de butuca, fiquei esperando pra saber quem seria a pessoa bem New York. Eis que meu diretor de criação solta o nome dele, a LENDA, Jerry Seinfeld. Eu quase caí pra trás. Eu sou discípula, fanática dessas que fala a fala junto com os personagens. Quando eu morava lá no Upper West, minha diversão era andar pelas ruas dele, acabei descobrindo até o homem do episódio da sopa na 55th.


E ele, Jerry (depois de saber que ele ia filmar meu roteiro, me senti íntima do moço), topou. E eu fiquei com aquele riso histérico de "não acredito que isso vai acontecer", mas com o pé atrás de "só acredito vendo". E foi que foi que foi que deu certo. Na primeira reunião, falamos com ele pelo telefone. Eu mudinha do outro lado da linha, só ouvindo e deixando o diretor falar, com medo de sei lá, falar alguma coisa sem graça e me arrepender pro resto dos dias. E o medo dele me achar sem graça? Olha que tudo fica pequeno nessas horas. Você que sempre teve aquele medinho do que seu diretor de criação e do que os jurados dos prêmios iam achar do seu trabalho, saiba que não é nada, comparado ao medo de ser sem graça.


A parte dos diretores também é muito legal. Como é um job que o cliente é a cidade, é tudo "pro bonus", ou seja, ninguém cobra nada. Mas pra todo mundo é interessante estar num projeto desses, então, você pode escolher o diretor, a produtora, quem vai finalizar, editar. E quando você começa a ver os rolos de quem tem pra escolher, e só vê aqueles comerciais sensacionais, todos os que ganharam Cannes, é muito bom. Você imagina que o mesmo cara que fez os filmes da Nike vai filmar seu roteiro. Primeiro, fica feliz da vida de pensar que pode ficar tão bom. Depois, fica arrasada, achando que devia ter pensado mais pra ter um roteiro à altura dos caras.


Aí começam as reuniões de produção. Eu percebi uma coisa aqui, diferente do Brasil, que é a força do diretor no seu comercial. Aqui os diretores têm um poder absurdo, tipo de mudar seu roteiro se acharem que devem. Eu sou daquelas que acredito que qualquer palpite acrescenta, mas peraí campeão, não vamô mudar a idéia central porque você acha que a luz do Empire States é mais bonita do que a da Brooklyn Bridge. Aí eu, que sou pititinha, subo nas tamancas. Aqui eles me chamam de "Laura so nice", porque tudo eu falo: "So niiiiiice….". Mas tem horas que você precisa colocar um limite. Uma amiga minha, também brasileira e diretora de arte aqui, há cinco anos, tem uma teoria que faz sentido: no Brasil a indústria do cinema não é tão forte como aqui, então nós publicitários fazemos o papel dos descoladinhos, artísticos. Mas aqui, os publicitários não são nada de mais. E o lugar dos bacaninhas fica pros diretores. Esses sim pegam gente em bar dizendo que são diretores.


Bom, depois dessas reuniões todas marcou-se a data. O único problema era que o Seinfield não tinha todo o tempo do mundo. Ele falou que só podia ficar disponível por cinco horas, mas o roteiro passava por seis locações diferentes.


Aí entra a produtora. É coisa de cinema mesmo: filma dentro do taxi, câmera aérea, tudo pra usar o Seinfeld o mais e o melhor possível.
Eu fiquei igual criança de cinco anos quando ele chegou pra filmar. Fiquei com um sorriso tão gigante, tipo “Podemos ser amigos pra sempre?”, que ele ficou meio sem reação. Mas foi um fofo. Nada de estrelismo, sorria pra todo mundo que passava e, sim, o cabra é engraçado. Ele soltava umas frases que dava vontade de sair anotando. E nem sabia o quanto isso era importante pra mim. Não que o roteiro fosse lá grandes coisas, mas sei lá, era meu primeiro filme aqui, foi uma das razões pelas quais eles me contrataram e eu nunca tinha feito comercial, nem com o Fábio Junior. Isso tudo pra mim era demais.
Fiquei sem graça de tietar, pedir autógrafo, mas na hora de tirar a foto da agência fiquei do ladinho dele. E, no dia seguinte, cheguei aqui e perguntei pros produtores: "E aí, o Jerry perguntou de mim"?


O filme tem versao de 30”, 60”e 2’30”.


Na próxima coluna eu dou um jeito de mandar ou colocar um endereço que dê pra assistir. Mas de antemão vou avisando que a produção foi mais legal que o roteiro, por isso o motivo da coluna ser esse.


Beijos
Mrs. Jerry


{Aproveite o embalo para ler o texto que deveria abrir esta série de participações da Laurinha, mas que ficou perdido no universo virtual por uns mesessss.
Respire fundo, segure e siga em frente}


Enfim, acabou que deu tudo certo e agora eu tô em NY, dessa vez pra ficar. A primeira vez que a Laís me colocou aqui no site do Clube eu era um blog, que escrevia diariamente sobre como era ser redator por um mês na DDB de NY. Eu tinha vindo da DM9, que é o escritório da DDB no Brasil, durante minhas férias, pra ficar um mês fazendo tipo um estágio. Mas acabei gostando muito e por uma dessas sortes grandes da vida eles gostaram de mim e me chamaram pra ficar de vez.


Então, agora eu serei um dos "correspondentes internacionais" de vocês. Sempre achei o máximo aqueles correspondentes internacionais da TV, com o mapa do Cazalaquistão e a fotinho do dito cujo, lá parado, e a voz em BG: “Olha, Nascimento, a situação aqui no Zabalaquistão…”.
Prometo comentar o que estiver acontecendo de legal aqui, ou pelo menos, tentar. Ah, e eu tenho uma desculpa sensacional caso apareçam muitos erros de português. Posso falar que é porque eu escrevo em teclado inglês.


Tô falando isso porque eu tô escrevendo do meu computador, que, óbvio, tá setado pra corrigir a ortografia em inglês, e como eu estou escrevendo em português, imagina o Carnaval que não tá na tela.
Bom, eu quis muito mesmo que desse certo essa minha mudança. Não que eu não adorasse viver e trabalhar no Brasil. Adorava tudo e era muito feliz, mas sabia que essa experiência seria sensacional. E está sendo. Cada dia eu aprendo uma coisa nova, acordo e olho pro lado ainda meio onqueutô, aí eu olho e vejo que é aqui e fico feliz.


Tenho ido em tudo quanto é festa de propaganda. Com a diferença de que aqui você não encontra amigos, nem ex e nem pretês. Teve Art Directors, One Show e Andy’s Awards. Em todos dá um orgulho danado ser brasileiro.


Outro dia fui num que chama Good, Bad and Ugly. Um evento que premia as peças de propaganda que retratam a mulher de uma forma não ofensiva. É, é o país do politicamente correto, fazer o quê? E o engraçado é que como mulher e como redatora eu não me senti ofendida com muitas das coisas bad e ugly que estavam ali, o que me deixou preocupada. É pra eu ficar ofendida ou são eles que estão exagerando?


Ai, escrevi essa pergunta e me senti meio imitando a Sarah Jessica Parker digitando a pergunta no começo do Sex and the City. Com a diferença de que só ela deve conseguir caminhar aquele tanto de salto por NY, ou deve ter uma dublê cheia de bolhas e calos nos pés. E, coração, desculpa mas o aluguel daquele seu apartamento no Village custar 500 doletas, me fala onde tem porque eu já vi todos os classificados e não achei.


Tá vendo? Só porque eu falei disso acabou de pular um mail de uma imobiliária aqui na tela (eu sou dessas maníacas por mail, que fica com a tela do outlook ligada o tempo inteiro vendo chegou mail? E agora? E agora?) Bom, os caras ficam de segundo a segundo mandando opções de aluguel de apartamento. Tipo como no Brasil os corretores ligam: Vai Butantã? Vai Moema? Mas Moema pássaros ou índio? Um terror.


Enfim, eu tava falando sobre a premiação para as propagandas não ofensivas a imagem da mulher né? O bom é que eu fiquei mais atenta pra não criar coisas que sejam na linha esteriótipos, tipo mulheres que são desesperadas por casar, ou pelo peso, ou por jóias, ou por sapatos. Mas aí você cai numa linha tênue, do que é mundo real e engraçado e do que é ofensivo. É muita regra na brincadeira pro meu gosto, sabe?


Igual uma coisa que eu não sabia: não é educado chamar alguém de secretária. É assistant. Hãaaaa?? Sem contar os já óbvios afro-americanos e a questão do assédio sexual. Sensacional. No meu primeiro dia, a manhã inteira foi sobre como a empresa repudia essa attitude, yata yata yata. Ah, adoro essas coisas, falar yata yata yata pra quem gosta de Seinfeld é o que há. E pra mim, que sou daquelas mineiras que não conseguem demonstrar espanto por nada sem dizer Nóoooo, que é uma abreviação de Nossa Senhora, descobri que aqui tem o Geee…, que é abreviação de Jesus.


Bom, deixa eu me ater às questão de propaganda, que são o que me traz aqui. Tenho me surpreendido com uma mudança de comportamento. No Brasil, pelo menos nas poucas agencias (DM9 e Lowe) que eu tive oportunidade de trabalhar, os diretores de criação sempre gostaram de ver muuuuuitas opções. Óbvio que com o mínimo de bom senso, mas quantidade sempre foi considerado bom, prova de esforço (da quantidade vem a qualidade), fora a regra de rejeitar sempre a primeira idéia, essas coisas. Aqui, eles odeiam que você leve muita opção. Eles pedem: Edit. O que significa "fofinha, eu vi que você trabalhou, mas que tal me mostrar só o que você considera mesmo bom". O que força a gente a desenvolver um critério. Mas também faz você ficar meio chororô, tipo "e aquela idéia, sera que é boa? E se fosse aquela a boa"? Eu acabei desenvolvendo um truque que é Pilha A e Pilha B. A pilha A eu mostro e a pilha B eu deixo ali do ladinho, como quem não quer nada. No caso de não ter nada aprovado na A, ou dele se animar a ver mais coisas, eu taco a B.


Outra coisa que adorei e que seria sensacional ver em mais "agencies": todos os jobs grandes aqui vão para uma parede e qualquer um pode fazer. Tem uma dupla que responsável por ele, pra valer, mas você pode ir lá, fazer algo e apresentar. Não é sensacional? Sem hierarquia de duplas, tipo só seniors pegam jobs melhores. É todo mundo de igual pra igual, o que vale é a idéia. Eu adorei isso e tento fazer todos. As vezes, calha da dupla que tava com o job não pular de felicidade ao saber que o roteiro escolhido é de outro, mas fazer o quê? Quem fez melhor, merece.


Quê mais? Na TV seguem os reality shows. Tem um que é simplesmente o uó, com o Donald Trump e uma turma de jovens de Wall Street, com desafios de finanças. Quem não rende, ele demite. Ele balança os poucos cabelos que restam naquela cabecinha, que devem ser fios de ouro, e grita: You’re fired. (Li que ele registrou essa frase. Sensaconal. Agora você não pode mais dizer You"re fired e tem que falar "Você poderia se ausentar da minha companhia para sempre, por favor?”, senão paga royalties pro fofo?)


E um outro reality é uma loucura. São jovens que querem ficar parecidos com seus ídolos e fazem uma cirurgia plástica completa no corpo e na cara. E eles mostram a cirurgia, nego botando queixo pra ficar igual ao Brad Pitt, umas meninas fazendo lipo pra ficar igual a Britney. E no final eles mostram e você vê que não adiantou muito, só que a figura acabou cheia de hematomas. O muuuuuuundo maravilhoso dos americanos.


 


Beijos
Laura (ou Lóoooooooura, que é como eles me chamam por aqui) laura.esteves@ny.ddb.com

Eu e Jerry

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