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Festival do Clube

Como proteger os meninos das telas?

08.10.25

All we need is love, diálogo, comprometimento e envolvimento das famílias, das autoridades e de toda a sociedade para proteger nossas crianças e adolescentes também na internet. Parece trabalhoso. E é. Mas extremamente necessário. Foi sobre isso o painel “Como salvar os meninos das telas?”, que aconteceu no início da tarde do sábado, 4 de outubro, no auditório Simon Bolivar do Memorial da América Latina, durante o Festival do Clube 2025. A conversa deu sequência ao debate do ano passado, que teve foco nas meninas (relembre aqui).

A mediadora do painel, Maria Mello, jornalista e coordenadora do programa Criança e Consumo do Instituto Alana, que esteve na condução das duas mesas, celebrou no palco a sanção, no último dia 17 de setembro, do ECA Digital, consciente de que este é um passo importante em uma longa jornada. Conhecido como Projeto de Lei 2628/2022, agora é lei o estabelecimento de obrigações para aplicativos, jogos eletrônicos, redes sociais e serviços digitais voltados para o público infantojuvenil, visando proteger os direitos de crianças e adolescentes no ambiente digital. “Queremos proteger as crianças e adolescentes na internet, não dá internet”, diz ela, enfatizando que não é justo nem produtivo querer excluí-los totalmente do mundo digital na era em que vivemos.

Resgatando um pouco do painel do ano anterior, Maria ressalta que as meninas estão mais sucetíveis às dinâmicas das redes sociais, de validação com o like e comparações, e os meninos às exposições mais viciantes, como os games. Ela lembra que o autor do livro “A Geração Ansiosa”, Jonathan Haidt, tem mostrado gráficos muito claros disso em suas apresentações, inclusive em suas passagens pelo Brasil. “As empresas interessadas nesse modelo de negócios sabem disso e a nova lei exige que se responsabilizem” diz ela, que também passou por questões como a pasteurização da identidade e o consumo exacerbado da pornografia e de imposições violentas.

Januária Cristina Alves, jornalista, escritora, especialista em Educomunicação e Infoeducação da USP, membro da Aliança Global para Parcerias em Alfabetização Midiática e Informacional da Unesco, lembrou que a criação e educação sempre tiveram seus desafios e que eles são cíclicos. “Quando meus meninos eram crianças – hoje um tem 23 e o outro 25 – o desafio era evitar os desenhos do Pica-Pau que eram violentos e estimulavam maus-comportamentos. Com a internet, os desafios ganham escala e velocidade”. Por isso, a importância de termos pessoas atentas, iniciativas como a nova lei que chama as empresas envolvidas nos algorítimos para a conversa, e a produção de bons conteúdos para que crianças e adolescentes possam se divertir e aprender de forma segura também no ambiente digital. Segundo Januária, “o mais importante é estar disposto a ouvir e estabelecer o diálogo com os adolescentes”.

O pscicanalista, doutor em psicologia pela USP, e autor do livro "O sujeito na era digital: ensaio sobre psicanálise, pandemia e história”, Leonardo Goldberg, trouxe para a mesa que vivemos uma epidemia da solidão, inclusive para as crianças e adolescentes, que se reflete em toda a sociedade. Segundo ele, o uso da tecnologia vem como sintoma da dificuldade de criar laços no universo real. Mas ressalta que, por exemplo, quando os adultos responsáveis cortam 100% o acesso de um filho a um game, sem uma avaliação do contexto, podem estar tirando dele o único ponto de contato com um grupo de amigos em um ambiente em que se sinta minimamente seguro para interagir. “Podemos estar jogando a criança numa solidão ainda mais profunda”, diz ele, reforçando a necessidade de atenção para cada caso. Segundo o psicanalista, outro fenômeno é o comportamento de muitos jovens de 17, 18 anos que ainda vivem e são tratados pelos pais como crianças ou pré-adolescentes. “Existe uma linguagem e comportamentos muito novos e precisamos mergulhar no mundo deles para compreendê-los e ajudá-los”, afirma.

Chefe da Unidade de Adolescentes - Instituto da Criança e do Adolescente do HCFMUSP, Benito Lourenço chega ‘tocando a real’ de que a adolescência não é sobre uma explosão de hormônios, mas sobre como o cérebro funciona nesta fase da vida. “Aos 12, 13 anos, há uma área central no cérebro, que podemos chamar de acelerador, que está totalmente formada e pronta para agir. Ela estimula o desejo de experimentar o novo. Enquanto isso, o conhecido córtex pre-frontal, área do freio, que faz pausar e pensar nos riscos, só fica pronto entre os 23 e 25 anos”. O que explica muitos dos comportamentos nesse intervalo entre 12 e 25 anos.

Ele contou sobre um teste realizado com um game envolvendo carros onde se pode parar no sinal amarelo, evitando um acidente, ou seguir no amarelo e aumentar em 30% as chances de bater em outro carro. Quando comparados os resultados de adolescentes com os de adultos, no teste, os mais jovens levam muito mais batidas, ou seja, se arriscam muito mais. Quando há amigos assistindo ao teste, os adolescentes se arriscam ainda mais. “Nessa hora, penso na exposição das redes sociais e na consciência de que estão sendo assistidos pelos amigos”, destaca o médico. No entando, se a mãe é colocada para assistir ao teste, o adolescente diminui sua exposição ao risco. “Isso me faz acreditar que há saídas”, diz ele, lembrando de uma pesquisa onde os adolescentes afirmam acreditar que os pais não têm ideia do que acontece com os filhos. “Eles precisam sentir que nos importamos de verdade com eles”.

Em campo com uma pesquisa sobre adolescência, Rita Almeida, head de estratégia e líder do Laboratório Humanidades da AlmapBBDO, que atualmente convive com o neto e a enteada, ambos de 14 anos, traz um olhar de amorosidade e respeito para essa fase. Nessa etapa da vida, se misturam a busca pelo aprender a ser livre, por alegrias explosivas, e uma angústia muito grande.“Precisamos olhar o adolescente sem preconceitos e entender que, ao contrário do que acreditamos como sociedade, eles estão sim muito preocupados com quem são e com quem se tornarão no mundo”.

Rita Almeida lembra ainda o peso que a "sociedade do desempenho" representa para os adolescentes, o que é confirmado pelo caçula da mesa, o ator Jean Paulo Campos, 21 anos. Para ele, a busca por desempenho baseado no que se vê na internet afeta diretamente os meninos.

Além de atuar, Jean, que ficou conhecido no papel de Cirillo, de Carrossel, também é influencer e diz se preocupar com o poder e a responsabilidade que tem nas mãos. “Eu quero atuar em grandes filmes, mas preciso da publicidade e sei que influencio meu público a querer o que eu mostro. Não quero que as pessoas que me seguem sintam o que eu sinto quando vejo um influencer de 15 anos dirigindo uma Lamborghini e penso que não tenho o que ele tem e talvez nunca tenha”. Ao mesmo tempo, Jean Paulo Campos quer deixar uma mensagem positiva para que seus fãs confiem em si mesmos. “Evito a ostentação e acredito que, se hoje o algorítimo nos puxa para publicar esse tipo de conteúdo, de passinho em passinho vamos chegar ao momento em que o algorítimo também vai valorizar as coisas boas”.

Sobre este tema, o piscicanalista Leonardo Goldberg diz que uma das formas de cuidar dos adolescentes é “ajudá-los a diminuir a pretensão do ideal”, tão vendida nas redes sociais e a um clique de acessarmos. Um chamado a encarar o mundo real e o que é possível e verdadeiro.

Para encerrar, Rita Almeida faz um convite para mudarmos nossa visão antiga sobre a adolescência, propondo algumas práticas:

Trocar a autoridade de pais e líderes pela credibilidade, uma relação que começa a ser construída na infância. Trocar o julgamento pela empatia e a cobrança pela confiança, a ponto de deixar claro ao adolescente que ‘eu sei que do seu jeito, nas suas pequenas vitórias, você vai triunfar". Trocar as proibições por ajudar a construir senso crítico, de forma que os adolescentes possam fazer suas escolhas mais seguras, sem perder a diversão, tão essencial nessa – e em todas as fases da vida. Trocar a falta de paciência pela curiosidade: se dedicarmos tempo, depois da ‘marola’ das respostas monossilábicas vem a conversa. Ouviu um ‘é, sim, não’ como resposta, não desista. Permaneça ali, ao lado. Dê tempo de qualidade que o diálogo flui. E, principalmente, abrir o coração com amor para atingir essa escuta”.

Leia a prévia deste painel aqui.

Rita Durigan

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