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Festival do Clube 2023

Rosane Svartman: novela precisa de diversidade de roteiristas

23.10.23

Reflexo da sociedade, catalisadora de audiência e forte referência de cultura popular, a telenovela foi tema de um dos debates do segundo e último dia do Festival do Clube de Criação, no domingo (24/09), no Memorial da América Latina, em São Paulo.


A origem das tramas e personagens que prendem a atenção do dia a dia de boa parte dos brasileiros permeou o conteúdo do painel "O processo criativo de Rosane Svartman".


Ela é a autora da história de "Vai na Fé", sucesso recente na Rede Globo, novela que alcançou significativos pontos de audiência e atraiu 15 parcerias com marcas de diversos segmentos de produtos.


Também produtora e diretora, Rosane falou sobre seu processo criativo em uma apresentação em formato de entrevista feita pelas publicitárias Daniele Marques (CCO/sócia - Bold), Jessica Almeida (diretora de criação associada - Gana) e Laura Esteves (vp de criação - DM9).


Autora do livro "A telenovela e o futuro da televisão brasileira", lançado em julho pela Editora Cobogó, Rosane também escreveu “Malhação: intensa como a vida”, em 2012, "Totalmente demais" (2015) e "Bom Sucesso" (2019), todas atrações na Globo e as duas últimas, em parceria com Paulo Halm. Para a Globoplay, ela assinou a série infanto-juvenil "Vicky e a musa".


Antes das novelas, atuou como roteirista e diretora de cinema. Entre seus longas estão "Como ser solteiro” (1998), “Mais uma vez amor” (2005) e “Desenrola” (2010).


"A novela tem de ter viradas", ensina Rosane. Tais viradas são aquelas rupturas que dão uma chacoalhada na história, com guinada na trajetória das personagens e em todo o contexto do folhetim. "Esse conceito de viradas acontece de um jeito diferente em relação a um filme ou a uma série", ela comparou, mencionando o famoso romance francês, "O Conde de Monte Cristo", de Alexandre Dumas, escrito em 1844, como um "bom exemplo" dessas viradas. A obra de Dumas inspirou várias novelas no Brasil, inclusive na própria Globo, além de montagens teatrais e roteiros de cinema mundo afora.


Na abertura do painel, Rosane resumiu como funciona, de maneira geral, o seu trabalho na emissora. "Primeiro eu faço uma pré-sinopse e mando para o meu chefe", conta, lembrando que atualmente o seu superior é José Luiz Villamarim, diretor do núcleo de teledramaturgia da Globo desde o final de 2020. Antes, o cargo era ocupado pelo autor de novelas Silvio de Abreu.


A pré-sinopse, segundo Rosane, é um texto de aproximadamente 20 páginas. Já a sinopse, também de acordo com ela, tem cerca de 70. "Nem vou me dar ao trabalho de escrever a sinopse se o chefe não gostar da prévia", admite. "Para cada sim, recebo muitos nãos", justifica.


Depois de uma pré-sinopse aprovada, o processo anda. Além da sinopse completa, Rosane Svartman falou sobre a importância de estruturar o trabalho com o desenvolvimento de histórias paralelas, para atender à logística de produção de acordo com a exibição da novela. Em um conjunto de 170 capítulos, por exemplo, ela afirma que a emissora precisa ter certeza da "autoralidade".


Esse lado autoral, ela desenvolve com muita pesquisa. Rosane diz que faz esse trabalho, inicialmente sozinha, depende de uma série de técnicas, que incluem telefonemas estratégicos, de acordo com o assunto da trama. Além das ligações, faz entrevistas com professores, estudantes, advogados e, no caso de "Vai na Fé", com frequentadores de igreja. Na sequência, um grupo de pesquisadores entra em campo para "abrir o leque" do conjunto de dados pesquisados por ela.


Com a definição da história, entra também em ação a equipe de roteiristas. "Eu procuro ter uma sala bem diversa. Quanto mais a gente tiver uma sala de roteiro representativa, do ponto de vista da obra, essa obra vai ser melhor", diz Rosana, referindo-se a gênero, idade, orientação sexual e outros parâmetros de diversidade. "E também não adianta construir uma sala com representatividade se não houver escuta dentro da própria sala", alerta.


O desenvolvimento da história em si é sustentado por flexibilidade. "O espaço tem de ser aberto para críticas e sugestões. Às vezes, há um terceiro caminho de acordo com a experiência de vida de um dos roteiristas", exemplificou.


Rosane também destacou a presença de roteiristas comerciais dentro da sala de roteiro da novela, em um movimento que resultou em maior pertinência na criação de contextos para a inserção de marcas e produtos na novela "Vai na Fé". "Os roteiristas comerciais já sabiam o que iria acontecer nos próximos dois meses e puderam oferecer ideias mais interessantes para uma ação de merchandising não ter que acontecer a partir do nada. Pudemos construir os roteiros de forma mais orgânica", avaliou.


Respondendo às perguntas das publicitárias que participaram do painel, Rosane destacou a intuição. "Ela é a nossa maior habilidade. A gente precisa trabalhar com nossa intuição e com nosso feeling. Isso não vai dar para a inteligência artificial substituir", afirmou.


Svartman também analisou o papel social da novela. "Ela faz parte da cultura. Ela fala para uma nação. Muitas vezes, a novela é vista como subproduto, algo menor, mas enquanto ela fizer parte da cultura, vai ser relevante", ressaltou.


Marcello Queiroz


Leia também matéria anterior sobre o painel de Rosane Svartman aqui.


Leia matéria anterior sobre Mulheres Fotógrafas no Festival do Clube de Criação, aqui.

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