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Guillermo Arriaga e Miguel Bemfica

Você mataria por seu texto? [não perca]

04.01.10

Papo de Miguel Bemfica com Guillermo Arriaga, roteirista de Babel e Amores Perros*.


Sempre tive curiosidade em saber como se cria o roteiro de um longa. Curiosidade? Que nada. Inveja mesmo. E como disse Fernando Vega-Olmos outro dia, aqui na JWT, “não existe inveja boa. Inveja é inveja e ponto”. E para inveja de alguns, outro dia tive a sorte de ser convidado para um jantar com o consagrado diretor mexicano Guillermo Arriaga. O cara é um gênio. Escreveu Amores Perros, 21 Gramas e Babel, para dizer o mínimo.


O que começou com um jantar num restaurante basco de Madri acabou virando uma entrevista que gostaria de dividir com os amigos do CCSP. Curioso (digo, invejoso), pergunto: Como você consegue criar roteiros tão bacanas, Guillermo? Qual o segredo?


(G.A.) Começo do começo. A primeira linha que sai no papel é a primeira que sai na tela. Comigo não tem essa de editor modificando tudo depois. A primeira cena é a que está na primeira página desde o início do projeto. Por contrato, ninguém mexe numa linha. Não deixo espaço para improvisação. A não ser, claro, que eu esteja no set de filmagem. Mesmo assim, é difícil.


(M.B.) E você faz alguma investigação antes de começar a escrever sobre um país tipo Marrocos, como aconteceu em Babel, por exemplo?


(G.A.) Investigação? Sei que muitos roteiristas adoram, mas eu não pesquiso nada. Tiro tudo da imaginação e das coisas que conheço, do meu dia-a-dia. Existem coisas que são básicas, Miguel. Tenho uma filha adolescente. De nossas conversas, tiro muitas coisas, muitas falas, muitas ideias. Para extrair o melhor de um criador de cabras, você não precisa viajar. Criadores de cabras são iguais em todo o mundo. Marrocos, México, Rio Grande do Sul. É tudo igual. Não precisa inventar.


(M.B.) Você consegue "vender" fácil seus roteiros ou tem que lutar muito para vê-los na telona?


(G.A.) Claro que tenho que lutar. Luto como um cachorro. Para vender 21 Gramas peguei um avião e quase intimei o diretor a aceitar fazê-lo. Ele estava titubeando e eu tive uma conversa muito séria com ele. Posso ser muito chato tentando vender minhas ideias. Mas não desisto nunca. Nunca. O segredo para um bom roteiro? Tenho poucos truques, mas o básico é fazer a história arrancar a partir da metade da trama. Quando o espectador já está se acostumando com a história. Aí tento acelerar ainda mais o ritmo. Não tem erro.


(M.B.) E o que você acha dos críticos?


(G.A.) Não tenho problema com críticas. Quanto mais gente falando dos meus filmes, melhor. É claro que é melhor ter o NY Times falando bem. Só não aceito que ninguém faça piadas sobre um texto meu. Uma vez um crítico começou a me sacanear e eu o chamei para almoçar. Durante o almoço, lhe propus um duelo, dizendo assim: 'não sei se você sabe, mas eu mato por cada uma de minhas palavras. Suponho que você também mataria pelas suas, certo? Pois então, escolha as armas e o local. E eu lá estarei. Vamos ver se você tem coragem, cabrón.


(M.B.) Qual foi a reação dele?


(G.A.) Ele? Nunca mais falou mal de mim.


Pausa. Arriaga conta isso com um tom de voz que dá medo em qualquer um. Afinal, ele é um boxeador. Segundo dizem, perdeu o olfato numa briga de rua. Seus filmes são fortes. Ele pratica caça nas férias. Com arco e flecha. O crítico deve ter 'googado" isso antes de se meter com ele num duelo, penso. O jantar está ótimo. Pergunto se ele curte a Espanha. Ele diz que sim. “Da Espanha só não curto as touradas. Não dá para curtir um esporte em que um cara precisa colocar meias rosas”, brinca.


E o Brasil? Ele diz que ama o Brasil. Que foi há um mês ao Rio de Janeiro e ao Rio Grande do Sul para o lançamento do seu novo filme. Agora também está dirigindo. O filme, dizem, é ótimo. Dêem uma 'googada' por aí porque, quem viu, diz que é bem bom. Só vi o trailer e adorei. Pelo papo que tive com ele, deve ser mesmo muito legal. Para conhecê-lo um pouco mais, veja trecho de um documentário que a escola Cuca está fazendo com criativos respondendo à pergunta “O que você faz quando não tem ideia”?


Miguel Bemfica


ECD JWT Delvico, Diretor e Professor da escolacuca.com


*Arriaga é mexicano e nasceu em 1958. Com o roteiro de "Babel", concorreu ao Oscar de melhor roteiro original em 2007.

Comentários

Renata - QUE INVEJA!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Alexandre Lucas -  Muito bom, Miguel! Parabéns!


Tamiris -  Tenho muita admiração por quem escreve bons roteiros. Quem sabe um dia consigo um :)


Walter Lencina -  A gente pode matar pelas nossas palavras ou nascer pelas palavras de outros. Tanto faz. O que importa é que, quando alguém tem a palavra, temos que ouvir com ouvidos bem atentos, e era o caso. Valeu, Miguel.


Izabela Domingues - Parabéns, Miguel. Exercitando o lado jornalista também, hein? Grande beijo e feliz 2010.


rodrigo luchini - Arrasando Miguel. Eu diria q iniciará teu ano com pé direito no peito do mundo. Parabéns e confesso tbm...inveja. Abcs


Alex Garbini - Grande Miguel, Parabéns por esse excelente bate-papo. Inteligente e estimulante para continuar lutando por minhas palavras, ideias e conceitos. Super abraço.



 

Guillermo Arriaga e Miguel Bemfica

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