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O espaço é seu

O futuro a quem pertence? (Fernando Campos)

17.10.07

Fazia um calor senegalês naquele dezembro carioca, estávamos em 1978, e eu era uma criança no dia do aniversário, o que por si só somava uns 3 graus à já elevada temperatura.

Minha madrinha entrou no velho apartamento do Leblon munida de uma misteriosa caixa onde se via a marca Philco, mas definitivamente não parecia ser uma TV. Era meu presente de aniversário e se chamava Telejogo.

Telejogo?  É para assistir? Não, é pra jogar, como ping-pong, só que na TV e – ela ressaltava – tem um placar eletrônico que não deixa ninguém roubar o placar. Hoje percebo que ela devia roubar bastante no ping-pong, porque a ênfase era no mínimo esquisita.

Enfim, o que importa é que eu tinha acabado de ganhar de aniversário um pedaço de futuro. Eram 3 jogos: ping-pong, futebol e paredão. Na verdade era um jogo em três versões, onde pauzinhos e bolinhas eletrônicas interagiam sob comando de rudimentares controles giratórios.

Depois o futuro veio em cores, em mais resolução, em ações complexas, em tramas e roteiros intrincados, em cartuchos, depois CDs, em controles sem fio, em simuladores, em volantes Ferrari que tremem conforme a trepidação da pista. E o Telejogo, cujo grande serviço era colocar crianças e pais ao redor de algo divertido de jogar, sem nenhuma pretensão de simular a realidade, ele, o pobre Telejogo, ficou no passado. Certo? Errado.

Na esteira do sucesso mundial do Playstation 2 a Sony construiu a expectativa pelo seu sucessor. Mais realista, com mais definição, mais features, mais detalhes. O mundo real estaria reproduzido com exatidão numa batalha da segunda guerra, numa final de copa do mundo ou numa pista de corridas, dentro de seu novo Playstation 3.

Enquanto isso, no escritório da rival Nintendo, estrategistas tinham a tarefa inglória de não apenas recuperar o terreno perdido para o PS2, mas ainda precisavam barrar o quase certo estrondo de vendas que seria o PS3.

E foi aí que o futuro começou a mudar. Porque algum gênio percebeu que estamos vivendo a primeira geração de famílias no mundo onde TODOS os membros da família já nasceram e cresceram jogando videogame, desde o Pong (a versao original do Telejogo Philco) até os dias de hoje.

E se a busca de futuro da Sony era por um mundo virtual mais realista, mais tecnologicamente impressionante, a da Nintendo seria por unir esta família "gamista"  em torno de um jogo simplesmente divertido, que nivelasse pela media a capacidade de jogar de cada um, com uma obsessão pela jogabilidade e diversão e um quase desprezo pela ultra-high-mega-blaster-definition.

A experiência de transe individual provocada por um jogo de PS2 ou 3 seria substituída pela experiência coletiva de risos e gritaria de uma partida de tenis no novo console da Nintendo.

Pela primeira vez seria tão divertido jogar quanto ver alguém jogar.
Assim nasceu o Wii. Com seu controle orgânico de um botão apenas (contra mais de 10 no PS), com seus bonequinhos toscos e carismáticos, e com o bonus politicamente correto de ser um videogame onde você faz exercício enquanto joga.

Se você ainda não jogou, está convidado para um passeio por um futuro que ninguém viu. Aviso logo que meu índice no Wii Tenis já é semiprofissional, pra não causar constrangimentos. E enquanto jogamos, podemos lembrar da lição que os japoneses da Nintendo nos deram de presente: desconfie dos profetas marketeiros e seus best sellers. O futuro não está escrito.


Fernando Campos é sócio e diretor de criação da Santa Clara


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Comentários

Diego Machuca
- Muito estranho você não sitar a microsoft com o seu X-box 360º, que dá um show de realismo e interactividade virtual... sony e nintendo são patinhos perto dela... Porem ótimo texto... mas esse já é quase um assunto antigo e passado... o impressionante virá com os próximos consoles e games... diegobrazil@gmail.com


 Pedro - Ô, Diego, você não entendeu nada. Tsc, tsc, tsc.


Eduardo - Wii é tão legal quanto aqueles jogos de Master System, em que você jogava com a pistola. Ter um Wii então, é como ter uma Playland em casa. Video Game é diversão e realismo é pra exibicionista de Photoshop.


David - Quem tava no Stimulibox lá em Cannes sabe o quanto esse joguinho de tênis fez sucesso. Fez até a galera esquecer o rango grátis. Ou quase.


Morcega - Pedro...Realmente ... Precisa ter uma mente brilhante e genial, como quem escreveu, para entender o texto!!! Adorei....


Igor Almeida - Eu gosto do PS3 e do XBOX360. O Wii é muito chato.


Felipe Gaúcho - Para os que moram sozinhos, como eu, raramente existe essa experiência coletiva. Talvez por isso eu prefira a "ultra-high-mega-blaster-definition" aos bonequinhos toscos. Realmente os profetas se enganaram, mas meu PS3 já já será encomendado.


 

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