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O espaço é seu

Sou publicitária e sou legal (Carla Madeira)

19.10.12


Max, amante de Carminha, é um canalha. O tipo parasita, que faz qualquer negócio pra levar vantagem. Mente, rouba, se vende. Não quer saber de trabalhar, mas quer ganhar muito dinheiro.



Para manter esse sujeito no céu sem ter morrido, Carminha sugeriu para Tufão abrir uma agência de publicidade para ele. Max nunca estudou, não sabe nada de comunicação, mas a Carminha, aquele exemplo de mulher, não tem dúvidas de que esse é o negócio perfeito para quem tem o perfil do Max.



Por que será que a Carminha acha isso? Ou melhor, por que será que João Emanuel Carneiro, um sujeito muito bom no que faz, acha isso? Será por causa da imagem, já vencida, de que os publicitários são aqueles sujeitos com gravatas irreverentes, vivendo no mundinho fútil das badalações, ganhando dinheiro fácil ao vender ideias divertidas de ter como trabalho? Será por causa do mensalão?



Sabe, Max, há 25 anos, eu e minhas sócias, decidimos abrir a Lápis Raro. De lá pra cá, tenho trabalhado muito. Muito mesmo. Fiz jornalismo, publicidade, relações públicas e pós-graduação em marketing, e nunca parei de estudar. Tirei menos férias do que gostaria, fiquei menos tempo com meus filhos do que deveria. Sem sofrimento, eu gosto muito do que faço. Me envolvo com os desafios de todos os clientes da agência, me sinto responsável pelo resultado de tudo o que fazemos. Hoje, damos emprego para 100 pessoas. E ajudamos muitas empresas a crescerem, a entregarem produtos melhores, a pensarem no compromisso que elas têm com seus clientes e com a sociedade onde atuam.



Há muito tempo, superei as acusações de que, como publicitária, faço parte da pior parte do capitalismo. Nos acusam de criar desejos de consumo incontroláveis e desnecessários. Isso é uma novela chamada "O ovo ou a galinha", Max. Reconheço que faço mesmo parte de um sistema econômico e social que precisa ser repensado, eu e todo mundo, só que os hipócritas querem nos colocar sozinhos nesse lugar. Mas eu acredito que, para transformar o mundo, vamos precisar de muitas e impactantes campanhas. Nenhuma revolução vai acontecer sem a ajuda da comunicação. Sabe, Max, quando Santos Dumont inventou o avião, queria aproximar as pessoas e não que ele fosse usado para mandar uma bomba em Hiroshima. A publicidade também é assim: pode ser boa ou ruim, depende de quem faz. Acho melhor para o mundo você não fazer.



Ao acompanhar o julgamento do mensalão, me lembrei de uma frase que meu pai me dizia metaforicamente, tentando acalmar minhas precipitadas certezas adolescentes: não é porque existem médicos ruins que a medicina é ruim. Não se toma a parte pelo todo. O podre da fruta não é a fruta. Porque alguns publicitários e políticos agiram de maneira indecente não quer dizer que a publicidade não presta ou que devemos fechar o Congresso Nacional.



Muitas administrações públicas, em diferentes esferas, podem estar usando mal o dinheiro da publicidade. Há sempre um narciso achando feio o que não é espelho. Mas verdade seja dita: todas as administrações públicas precisam e deveriam estar usando bem a publicidade. Para informar, educar e orientar as pessoas. Todas as vezes que atendemos contas públicas, criamos campanhas fundamentais. Muitas outras agências também o fizeram. Na nossa última experiência com a Secretaria de Saúde do Estado de Minas Gerais, desenvolvemos durante dois anos as campanhas contra a dengue no Estado. Junto com a Secretaria, mobilizamos milhões de pessoas e conseguimos reduzir em 2011, em relação a 2010, 75% dos casos notificados em Minas Gerais, saindo de um cenário epidêmico que se desenhava. Tenho muito orgulho disso, e fizemos isso fazendo publicidade.



Sabe, Max, eu sou mineira, confesso que tenho um pouco de dificuldade de me posicionar assim tão claramente. Dizem que a gente trabalha em silêncio. E quem quer nos ofender nos coloca com os pés colados em cima do muro. Decidi que gostaria de dar um pequeno passo para mudar essa conversa. Eu não posso trabalhar em silêncio: eu sou publicitária. Tenho que trabalhar em alto e bom tom para que nossas campanhas façam muito barulho. Tenham visibilidade e impacto. E só posso ficar em cima do muro o tempo suficiente para ver os dois lados e escolher de que lado quero estar. E eu já escolhi. Muitos publicitários já escolheram, tanto que eu estou até pensando em fazer uma campanha: EU SOU PUBLICITÁRIA E SOU LEGAL. Nos dois sentidos. E sei que muita gente boa, competente e de confiança vai aderir. Tá me achando ingênua, Max? Não importa, vindo de alguém como você, é um elogio.



Carla Madeira, sócia e diretora e criação da Lápis Raro, em BH



 


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