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Mulherada saiu de moda? (Renata Sayão)
Semana passada, algumas amigas diretoras me escreveram inconformadas: um lançamento de filme— focado, ironicamente, em segurança para mulheres — foi dirigido por um homem. A questão não era a qualidade do filme ou a ideia central. Era sobre lugar de fala. Esse conceito, que aprendi com o tempo e, muitas vezes, com erros, me ensinou a importância de saber ouvir, de reconhecer quando não se tem a vivência necessária para ocupar um determinado espaço. E mais do que isso: entender o privilégio e agir sobre ele. Ao longo da minha carreira, especialmente quando fui head de produção na Publicis — agência que por cinco anos consecutivos foi a que mais filmou com mulheres — fiz questão de trazer mulheres para lugares historicamente negados a elas.
E não foi simbólico: colocamos mulheres dirigindo filmes de carro, de motos (né Alê?), filmes de esportes, filmes de final de ano. Projetos que tradicionalmente caíam no colo dos homens. E isso deu certo, não só pela representatividade, mas porque a perspectiva delas entregou um frescor criativo real, potente. Mais do que isso: a cada campanha no ar, sabíamos que estávamos fazendo mais do que um job. Estávamos abrindo portas. Criando futuros.
Recentemente, soube que o movimento "Free The Bid" chegou ao fim. Para quem não conhece, ele nasceu nos EUA e veio ao Brasil com o objetivo simples, porém transformador: garantir pelo menos uma diretora mulher em cada concorrência de filme publicitário. A ideia não era garantir cotas nem privilégios — era só oportunidade. Um lugar na mesa. O movimento poderia até ter acabado por já não ser mais necessário. Mas não. Ele terminou porque perdeu força. Porque perdemos o interesse. E, olhando o mercado hoje, vejo cada vez menos projetos com mulheres à frente na direção.
Isso, num setor que aparentemente está mais feminino do que nunca. Hoje, muitas agências têm lideranças femininas, boards com presença de mulheres, e algumas presididas por elas. Mas o que está acontecendo com a cadeia de produção? Por que o topo não está puxando o resto? Será que a conversa de “uma sobe e puxa a outra” ficou só no discurso? Será que a pauta da inclusão saiu mesmo de moda?
O audiovisual é apenas um exemplo. Mas essa sensação se repete em várias conversas de bastidores, em reuniões, em botecos. A pauta da diversidade vem perdendo espaço — silenciosamente. E isso assusta.
De acordo com relatório mais recente da Unesco sobre igualdade de gênero na indústria do cinema (2024), apenas 17% dos filmes comerciais no mundo são dirigidos por mulheres. No Brasil, segundo dados da Ancine, de 2025, esse número cai para cerca de 10%. E quando se trata de grandes campanhas publicitárias, especialmente nas áreas de automóveis, finanças ou esportes, esse número é ainda menor.
E aí eu pergunto: vamos deixar isso acontecer? Vamos aceitar esse retrocesso silencioso, que tira espaço de talentos incríveis só porque "não dá mais Ibope defender a equidade de gênero"? Vamos mesmo andar 10 anos pra trás?
Essa é uma provocação — e também um convite para que a gente volte a olhar para quem está por trás das câmeras. Para que, em vez de discursos prontos sobre diversidade, a gente volte a praticá-la com intenção.
E que cada mulher em posição de liderança possa olhar para o lado e se perguntar: quem eu estou puxando comigo?
Porque talento não falta. O que falta, mais uma vez, é oportunidade.
Renata Sayão – CBO Boiler Hub
Leia texto anterior da seção "O Espaço é Seu" aqui.
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