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Por que filme gringo tem cara de cinema?

Por Claudio Freire

31.10.06

Outro dia, o Dulcídio (Caldeira) ligou de NY para o Fabio (Miraglia), aqui na agência, para falar sobre o filme que nós criamos para a campanha internacional do HSBC. Para quem não sabe, os dois duplaram por alguns anos antes do Dulcídio seguir para a Almap. E foi ele quem deu a idéia. Disse que se a gente tinha conseguido produzir um filme internacional daqui de Curitiba, devia mandar texto para o Clubeonline, seguindo o exemplo do artigo que ele mandou para a seção Passaporte. Afinal, também somos de fora de São Paulo. 


Boa idéia, Dulcídio.


Bem, antes de falar da produção do filme, é necessário um pequeno preâmbulo. Em 2005, a JWT de Londres estava trabalhando em sua primeira campanha para o HSBC. Por sugestão do Craig Davis, diretor mundial de criação da rede, a agência resolveu reunir criativos de alguns escritórios ao redor do mundo em um grande brain em Dubai, nos Emirados Árabes.

Estavam lá Axel Chaldecott, diretor global de criação para o HSBC,  e o diretor global de planejamento da conta, que juntos coordenaram o trabalho das duplas: escritórios de Londres, NY, Dubai, Bahrein, Shangai, Hong Kong e Brasil (o Fabio e eu) estavam representados. No final de cada dia, havia uma apresentação informal – roughs, idéias para filmes, etc. – para o cliente e para o Craig Davis. Depois de 4 dias de trabalho, voltamos para o Brasil com o job pra valer e, de quebra, com um tapete que está na sala da minha casa.


A campanha, que foi ao ar no ano passado, acabou sendo criada dela JWT de Nova York, sob a coordenação do escritório de Londres.


A experiência deu certo. Tanto que em 2006, JWT e HSBC decidiram repetir a dose. Nos encontramos novamente, desta vez em Toronto. Das pessoas que estavam em Dubai, só estavam lá novamente a dupla de NY e eu, já que o Fabio não pôde ir. No lugar dele, foi o Jorge Uesu, diretor de arte aqui da agência.


Estávamos lá para decidir o próximo passo da campanha do ano passado. O processo de trabalho foi muito parecido com o que aconteceu em Dubai. A única diferença estava nas duplas que foram. Em vez de Dubai e os chineses, estavam lá os escritórios de Bangkok e Toronto.


Assim como aconteceu no ano anterior, voltamos novamente para casa e começamos a trabalhar no job. Fabio, Jorge, Leandro (Pinheiro), Mario (D'Andrea) e eu. Mandamos os roteiros – que a gente já escrevia em inglês – por e-mail para o Axel, que tinha dois trabalhos: escolher quais iria apresentar para o cliente e, lógico,  arrumar todos os erros de gramática. 


Alguns dias depois, o Axel ligou dizendo que tivemos alguns roteiros previamente aprovados, sendo que um era para produção imediata. Pouco depois, a RTV – se é que podemos chamar assim – da JWT de Londres entrou em contato, mandando alguns “reels” (portfólios) de diretores para nós escolhermos. Dentre os primeiros nomes, estavam os de Ivan Zacharias, Noam Murro, Daniel Kleinman e Peter Twaithes.


Como de costume, fomos assistir aos rolos. Confesso que sou péssimo para guardar nomes de músicos, atores de cinema, até dos parentes da minha mulher. De diretor de comercial então, nem se fala. Lembro da expressão no rosto de cada um aqui quando começamos a assistir os portfólios. Era um melhor do que o outro, leão atrás de leão. Ivan Zacharias fez, por exemplo, “Pilot” para Stella Artois e “Impossible Dream” para Honda. Noam Murro, a campanha da máquina digital da Olimpus, que ganhou leão de ouro no ano passado. O Kleinman, como lembrou o Dulcídio no texto anterior, fez o noitulovE, para Guiness.


Depois que nosso queixo voltou ao seu devido lugar, ligamos para a Clare Donald com nossas preferências. Fizemos algumas reuniões por telefone com alguns deles. Depois de ler alguns “treatments” (decupagens) decidimos, junto com o Axel, pelo Peter Twaithes, da Gorgeous Enterprises.


A primeira coisa que o diretor falou é que usaria lentes anamórficas. O que é isso? Mais uma coisa que aprendemos: a anamófirca é uma lente que deixa qualquer filme bonito. Vimos algumas referências de filmes feitos com esta lente, inclusive longas-metragens.


Outra discussão: onde filmar? Estavam entre Mumbai, Buenos Aires e Rio. Depois de algumas conversas, incluindo nelas o cliente, ficou decidido que seria em BA. Incrível como os caras tratam o globo terrestre como um mero tabuleiro de War.


Antes de irmos para lá (fomos o Jorge e eu), fizemos mais algumas reuniões por telefone com o Peter para discutirmos elenco, atmosfera, tom de voz, tudo. Ele já estava na Argentina, de onde nos mandava várias opções de elenco e locação.


Nossa primeira reunião tête-à-tête foi já em Buenos Aires. Foi quando o Peter mostrou uma coisa muito bacana, que eles chamam de “mood”: um shooting board do filme com cenas de longas-metragens.


Outra coisa que chamou a nossa atenção foi o profissionalismo dos hermanos. Toda a produção local foi coordenada por uma empresa argentina (Pioneer Productions). Mais de 90% da equipe de filmagem era portenha: câmeras, atores, figurantes e todo o pessoal que anda com fita crepe. Exceção feita ao diretor de fotografia e ao primeiro assistente do diretor. O primeiro era francês e o segundo, mexicano. Este foi escolhido por ser “de confiança” e falar espanhol. Era ele quem falava mais com a equipe e com os atores.


Um coisa interessante é que o editor do filme e o cara responsável pelo efeitos também estavam no set. O editor, como disse o Dulcídio no seu texto, tem um baita status. A cada cena, ele já fazia um rascunho da montagem, trocando idéias com o diretor. O mesmo acontecia com o cara dos efeitos. Perguntei se aquilo era praxe e eles disseram que não. Mas como o tempo estava apertado, eles decidiram levar.


Uma coisa que chamou a atenção é parecido com o que o Dulcídio falou da Traktor. A dedicação das pessoas envolvidas é muito grande. Trabalhe-se muito e trabalha-se bem. Antes de abrir a câmera, todo mundo já sabia como ficaria o filme. Além das conversas preliminares, toda manhã (foram 4 dias de filmagem) nós recebíamos um “shooting list”. Nele estava descrita cada cena que seria feita naquele dia. Todo mundo está, o tempo todo, mergulhado e concentrado no filme. E isso vale também para a equipe argentina. Não é à toa que eles estão fazendo filmes espetaculares.


Para encerrar, tem uma historinha para justificar o titulo do texto. Para não dar mole para os gringos, pedimos para ver o portfólio do diretor de fotografia. Clare, a produtora da JWT de Londres, disse que eles não costumam fazer isso, que é o diretor quem escolhe. Batemos o pé:


- Mas quem é o diretor de fotografia?
- Bruno Delbonnel.
- E você sabe me dizer que filmes ele já fez?
- Você assistiu Amélie Poulain?


Claudio Freire, redator da JWT de Curitiba


Nota da redação: A seção Passaporte publica textos enviados por brasileiros que vivem no exterior e nos contam como andam suas peripécias, por lá.  Nesse caso, apesar do Claudio Freire morar no Brasil, embora fora de São Paulo, como ele mesmo ressaltou, o texto foi aceito porque ele nos 'dobrou' logo no primeiro parágrafo, com todo aquele papo sobre o Dulcídio. Assim sendo, esse é um texto-exceção da Passaporte, combinado? Ah! Para ler o artigo do Dulcídio vá até Textos Anteriores, um pouco abaixo...


 Comentários 

Anônimo - "e você sabe me dizer que filmes ele já fez?" "Você assistiu Amélie Poulain?" - EU ME APOSENTAVA DEPOIS DESSA!


 caito - boa pergunta...por que será que filme gringo tem cara de cinema? olhando para esse filme de HSBC, deve ser porque a produção não teve um cronograma apertado, tipo tem que entregar tal dia, porque a midia já está comprada... ou talvez pelo fato desse filme de 30 segundos ter sido rodado em 4 diárias, nada mau. gringos são incríveis mesmo, escolhem a melhor locação, seja onde for [adoro war], escolhem o ator certo [e não o que o cliente acha que é certo], e realizam o projeto com o tempo que ele precisa [e não no tempo que cabe no orçamento]. ah esses gringos... caito@prodigo.com.br


Toniko - Claudio Freire, lentes anamorficas, "war", 4 dias para filmar, verba, Leões etc ... fazem a diferença mesmo !! Mas alguns pontos chamaram a minha atenção no seu texto, por exemplo: o "RTV" deles não era bem um RTV . É verdade, lá eles são uma espécie de produtor executivo, como o de um longa metragem e aí já começa uma diferença que se eu fosse me aprofundar aqui, não caberia nesse espaço. Mas tem um aspecto que vem de lá, que a publicidade daqui poderia começar a adotar desde já: o respeito e a valorização que lá eles dedicam aos diretores de cinema publicitário (como vc mesmo comprovou) diferentemente daqui onde esses mesmos profissionais são chamados de "fornecedores" e em algumas premiações os "fornecedores" (lá chamados de diretores) nem são citados. Mudar esse tratamento já seria um passo para um dia sermos vistos como vc viu o, de fato, maravilhoso e profissional trabalho dos "gringos". Parabéns pelo relato ! Ab Toniko  dotoniko@dotoniko.com.br 

Alessandra - Sabe Claudio, eu já trabalhei como 1ª assistente de Direção numa produtora aqui mesmo em Curitiba, a "CORPORAÇÃO FANTÁSTICA", que não peca sequer por um item descrito no seu artigo, a não ser pelo "Diretor de Fotografia da Amelie Poulain". Aí eu respondo à sua pergunta - "Por quê filme de gringo tem cara de cinema?" Well, provavelmente porque tem uma coisinha à toa que a gente não tem... BUDGET, baby! (sobre as anamórficas, elas só deixam o filme na proporção widescreen; o que confere aquela beleza plástica é a película 35mm e, novamente, isso é uma questão de VERBA). alemoretti@cinequanon.com.br


marlon klug - se a gente começar com este tipo de comparativo: 'há, é que com essa verba e com esse prazo até eu faço', o papo vira mané. porém, é divertido ver daqui de curitiba pessoas do mercado de são paulo reclamando de verba e prazo. caito, eu queria te convidar pra vir acompanhar uma filmagem aqui em curitiba para um cliente local. meu amigo, tu nem imagina a correria. pra encerrar eu gostaria de convidar os leitores do ccsp a colocar um comentário aqui elogiando o trabalho da jwt curitiba pelo simples motivo de o filme ser do caralho. hã, e também lembrar que deve ser um tesão pra uma agência ter um experiência como essa ainda mais estando fora do eixo rio-são paulo. hã, e lembrar também que todos nós diretores de cena algum dia babamos nos trabalhos da gorgeous. abraço grande e força sempre. marlon@corporacaofantastica.com




 

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