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Tomás Lorente

Por Alexandre Lucas

16.07.09

O Tomás era um idealista. Por trás de tudo o que fazia existia uma motivação maior, altiva, nobre. Nem tudo o que sonhou teve tempo de pôr em prática, mas suas realizações já preencheriam duas ou três vidas normais como as nossas.

Preocupava-se com a estética, mas nunca descuidou da ética. Apesar do enorme talento, jamais teve ambições desmedidas com poder e dinheiro. Nos mais de 10 anos em que trabalhei ao seu lado (primeiro na sua equipe e, depois, como seu dupla), vi inúmeras vezes o Tomás evitar o brilho dos holofotes. Por timidez e também por convicção. Nunca quis títulos ou exigiu reconhecimento (e talvez, justamente por isso, obteve e recebeu todos).

Liderava através do respeito, e não do medo. Elegante até para cobrar, nunca elevava o tom de voz, nunca destratava ninguém. Generoso como poucos nesta profissão, nunca deixou de dar o crédito a quem merecia. Pelo contrário, adorava descobrir e impulsionar um novo talento.

Sua ambição maior não era ser, e sim fazer. E quando se propunha a fazer algo, entregava-se totalmente com paixão e compromisso.

Gostava tanto do que fazia que recortava e tratava as próprias imagens. E quando todos iam pra casa dormir um pouco antes da apresentação, ele refilava e montava pessoalmente os layouts.

Tinha um amor incondicional ao Zaragoza. Adorava contar histórias sobre seu bom gosto, generosidade, alegria de viver, talento e humildade. Lembro das muitas vezes em que eu cheguei na agência e ele já estava lá com uma cara feliz (ele sempre chegou muito cedo, além de detestar atrasos). Depois de alguns minutos, comentava sorrindo, sem tirar os olhos da tela do computador:
“Ontem eu meti o pé na jaca no estúdio do Zara…”.

E eu sabia que aquele sorriso era o mais puro orgulho, quase adolescente, de fazer parte do círculo íntimo do seu mestre.
Lembro de ter ido com ele ao lançamento do livro Layoutman. Abraçaram-se carinhosamente, o Zaragoza escreveu um dedicatória linda e o Tomás, não querendo atrapalhar a enorme fila de cumprimentos, chegou para o lado. Então, abriu o livro e, lá dentro, reencontrou uma parte fundamental da sua própria vida.

Mostrou-me anúncios nos quais ele tinha sido o assistente de arte, explicando-me em detalhes as orientações que o Zaragoza havia dado para a execução do layout. Admirado de ver tantos layouts com 40 anos de idade, repetiu uma frase do Zaragoza que ele próprio não se cansava de dizer: “Quem guarda, tem”.

Ao abrir sua primeira agência, o nome tinha três letras (que não eram as iniciais dos sócios porque o Tomás não quis). O layout era branco e elegante, idêntico ao da DPZ. Até os móveis eram iguais, as mesmas cadeiras, as mesmas mesas.

Olhando de fora, percebia-se que eles tinham uma relação de pai e filho da vida, desses que surgem sem a gente pedir.

E sua maneira de celebrá-lo era sendo um pouco Zaragoza em tudo o que fazia.

Outra característica sensacional no Tomás era sua habilidade para fazer amigos. Dono de um magnetismo pessoal e um charme irresistível, ele cativava a todos. Do presidente da empresa ao assistente de arte, centenas de pessoas faziam parte da sua famosa legião de seguidores. Gente que fazia de tudo por ele. De graça caso fosse preciso. E até pagando se necessário.

Conquistava muitos amigos novos o tempo todo e cultivava seus velhos amigos como poucos. Vivia ao celular, porque fazia questão de falar com eles diariamente. Inclusive, acho que esse foi o motivo dele desistir de andar de carro e passar a andar de táxi (podia ter motorista, mas seu jeito de ser não permitiria): assim tinha mais tempo para ligar para os amigos.

Fazia com que seus amigos virassem amigos entre si. Era um oceano para onde corriam todos os rios.

Foi meu pai, irmão, maior incentivador, parceiro de grandes conquistas e de momentos difíceis. Foi o meu timoneiro e também o meu farol.

Seu pedido era uma ordem cumprida. Mesmo que eu não entendesse o porquê, eu sabia que certamente valeria a pena.

E como valeu.

Saudade é uma palavra que só existe na língua portuguesa. Talvez eu me dedique a criar outra palavra tão única como esta, porque saudade não vai ser suficiente para descrever o que eu sinto agora.

Ele me ligou poucas horas antes de ter o enfarto. Combinamos de almoçar no dia seguinte. E no dia seguinte eu lembrei da frase “Quem guarda, tem”.

Tudo o que ele me ensinou está aqui, guardado. Para sempre.

Alexandre Lucas
  
 Comentários

Fernando Mattei -  Puta verdade esse texto... Valeu Tomas.


SERGIO CAMPANELLI - ALE QUERIDO, SOH AGORA LI ESTA MARAVILHA E TAO CARINHOSO TEXTO QUE VC FEZ PARA O NOSSO QUERIDO AMIGO, QUE FALTA QUE FAZ O TOMAS. ATE RIMA! BJS CAMPA



 

Tomás Lorente

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