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Um brasileiro em Lisboa

A Garrafeira do Pedrão

14.10.09

 Morei no Rio até os 19. E, nesses anos todos, fui ao Cristo-Redentor apenas duas vezes. Acho que quando você mora na cidade em que os pontos turísticos estão localizados, acaba sempre deixando para depois. É aquela sensação de "está lá, um dia eu vou".

É bem diferente de quando você está em um outro país com os dias contados e a máquina digital com cartão de memória de 5 gigas pendurada em um dos braços, com o taxímetro da diária do hotel a rodar.

Bom, aqui em Lisboa isto também acontece. O ponto turístico a que me refiro não é um mosteiro, uma igreja, um lugar desses que está na capa de um guia do Lonely Planet.

Estou falando ou, como diriam os portugueses sem o nosso amigo gerúndio, estou a falar da Garrafeira do Pedrão. 

Ok, não é um ponto turístico tradicional mas, cada vez mais, faz parte do roteiro daqueles que circulam pelo Bairro Alto agarrados em guias que dizem Lissabon e Lisbonne na capa.

A Garrafeira do Pedrão na verdade se chama Garrafeira Alfaia. Mas o Obi-Wan Kenobi atrás do balcão, esse se chama Pedrão. Portanto, Garrafeira do Pedrão.

 A dica não é minha. Começou com a Daniela Ribeiro. A Dani descobriu e dividiu a informação com os amigos. A Keka, ao visitar a cidade, comentou de tudo um pouco. Mas da Garrafeira, comentou muito. E agora, mais recentemente, o Gustavo, ao pousar em Lisboa, trazia com ele algumas folhas rabiscadas com dicas. Muitas dicas. De várias pessoas. Inclusive da Dani. Em todas elas o mesmo nome gritava em bold, itálico, underline, fonte 16 caixa alta: Garrafeira do Pedrão.

E é aquela coisa. Eu já tinha escutado a Dani falar da Garrafeira do Pedrão mas sempre pensava: "Putz, está lá desde... um dia eu vou".

Aí os comentários foram acumulando e eu no esquema Cristo-Redentor: "O negócio está lá desde de... de... um dia eu vou".

Mas o bold, itálico, underline fonte 16 caixa alta me alertou que eu poderia estar cometendo um dos maiores erros da humanidade. Maior até que o do Cerezo em 82.

Então, num dia de semana, após o trabalho, marquei com o Gustavo e a Tatiana no coração do Bairro e fomos até a Garrafeira.

O lugar é escondido. Passamos pela porta uma vez e tivemos que catar o número nas portas para fazer o rewind. Você não vai encontrar o nome do fera em nenhum lugar. Vai encontrar "Garrafeira Alfaia" pintado na fachada e bordado nos uniformes.

Mas, voltando à descoberta, encontramos o lugar, entramos e perguntamos meio sem graça: "Esse Alfaia é, na verdade, o Pedrão?".  E um sujeito abriu um sorriso simpático e genúino atrás do balcão e disse: "Eu sou o Pedrão". E o Gustavo, como quem menciona para o dono de qualquer estabelecimento em Xerém: "Opa, quem me recomendou este lugar foi o Zeca Pagodinho!", logo se apressou em dizer: "A Daniela recomendou esta visita. A Daniela da Fischer. Muito prazer".

Ao escutar estas palavras mágicas, o Pedrão conseguiu espremer mais um dente de cada lado da boca no sorriso e alcançou a primeira garrafa de vinho. Foram duas taças de vinho e uma de moscatel. Em cada taça, uma breve aula de história com um vocabulário simples. O fera consegue encaixar uns 36 adjetivos diferentes para descrever um vinho. E depois do primeiro gole, você concorda e chega a conclusão que não era bullshitagem. Ah, tudo acompanhado pela dupla dinâmica: queijo da serra e presunto de porco-preto.

No final, saí de lá arrependido de não ter levado antes o meu fígado para tingir de roxo na Garrafeira. Uma sensação que eu havia sentido uma única vez na vida. Foi quando visitei o Cristo-Redentor pela primeira vez, depois de velho. E voltei no dia seguinte.


Se você estiver com planos de visitar Lisboa, faça como o Gustavo, coloque a Garrafeira do Pedrão em bold na sua lista. Bold, italic, underline. Tudo junto.  E exagera no tamanho da fonte.  A Garrafeira fica no Bairro Alto, Rua Diário de Notícias, 125.


Erick Rosa, diretor executivo de criação da Leo Burnett Lisboa


Leia textos anteriores da coluna Um Brasileiro em Lisboa aqui.


[Cá entre nós, que ninguém nos ouça, Erick agora está mega chique (aqui).]


Comentários

Renata Corrêa - Estive la ha poucos dias... delicia! Pedrão simpatissimo, mas não é brasileiro, mas com certeza é o lugar predileto dos brasileiros por la para um bom vinho no cair da noite. Achei engraçado sair aqui... coisa de publicitario...


Paola -  É realmente um crime vir prá Lisboa e não conhecer o Pedrão...


monica andrade - Quem me aprsentou esse lugar, o Pedrão e o Junior foi a Dani Ribeiro (valeu Dani !!!). É o meu lugar preferido aqui em Lisboa !!!


Renata Corrêa - Agora entendi tudo, na sexta quando entrei estava sem o texto. Boa!


Gustavo Diehl -  Boa, Erick. Pode contar mais um estabelecimento de Lisboa com um texto teu colado na parede. Abraço.


Daniela Ribeiro - Adorei Erick, e que bom que você também virou fã desse português mais brasileiro que existe. Como meu fígado sente saudade dele ;-)


Ana Paula Catarino (da Oca Filmes) - Vou anotar esta boa dica na minha agenda. O Bairro Alto era mesmo para mim na infancia, como o Cristo Redentor deve ser para vocês cariocas. Já tinha por lá passado algumas vezes, mas fui conhecer mesmo depois de morar em NY. (O Empire State e o WTC eu visitei a pedido de meu filhinho, senão tambem teria deixado para um dia.......) Mas, hoje não vou a Portugal sem passar por lá para comer o choquinhos na braza, ou sardinhas na tasquinha que o meu pai me levava. Se ainda em Lisboa quiser matar saudade do Cristo Redentor, atravesse a ponte 25 de abril (aquela que é identica a Golden Gate de SF) e visite o Cristo Rei. Não se compara ao RJ, mas vale a pena.


Renata Correa - A alheira de bacalhau é incrivel!!! Dani, Pedrão mandou uma foto pra vc, ja estou com teu e-mail pra te enviar!



 

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