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Vôo 3054

Existe país além da cabeceira da pista?

23.07.07

Existe país além da cabeceira da pista?


O aeroporto de maior tráfego aéreo do país.
Localizado no coração urbano da maior cidade do país.
Sem área de escape, com pista curta, cercado de residências e prédios, colado em algumas das avenidas de maior movimento do país.

Você acha que é de estranhar que nele pudesse ocorrer o maior acidente aéreo do país?

É claro que não. Quando todos os detalhes de uma equação estão errados, o resultado é um erro matematicamente do tamanho da soma das partes.

Pode ser cômodo ter um aeroporto dentro da cidade.
Mas quando a comodidade ameaça se tornar mais importante que a vida, os acomodados que se mudem.


Aeroporto no lugar errado


Todos sabem que Congonhas não pode mais estar onde está. Com o crescimento da cidade e das operações aéreas, a convivência entre essas duas se tornou uma mistura mais instável que nitroglicerina.

Nas mesmas condições, em um aeroporto longe de prédios, de área residencial e com área de escape suficiente, o Airbus  provavelmente não se tornaria a estatística recorde que a imprensa agora divulga.

A queda do Fokker anos atrás, matando mais de 90 pessoas e caindo sobre casas, já havia sido evidência de absurdo suficiente para qualquer pessoa de bom senso.


É como disse na TV um especialista em avaliação de risco na noite do acidente do Airbus: a existência de um aereoporto naquela localização é, em termos de estatística de risco, inaceitável.


Como são inaceitáveis várias das coisas com as quais temos aceitado conviver, como a corrupção, o desvio de verbas públicas, a violência urbana e o crescimento do crime organizado.


É importante perceber que o acidente de Congonhas é um sintoma.

E o que se vê sempre que algo assim acontece, é o país discutindo miope o sintoma, ao invés de combater a doença. Essa doença chamada “passividade conformista”.
Doença sua, minha, nossa.

Um mal que faz com que depois de ficarmos chocados com tragédias como a de Congonhas ou a do menino arrastado vivo fora do carro por bandidos no Rio (já esqueceu?), voltemos sempre conformadamente a fazer o que fazemos, da maneira como sempre fazemos, esperando que alguém pago para fazer algo, faça a coisa que deve ser feita.


Um país que precisa decolar


O que já deviamos ter aprendido há muitas tragédias atrás, é que não existe “alguém”.

Não há ninguém além de nós mesmos. Um governo é só um espelho do povo que o elege. As intituições são reflexos da qualidade dos cidadãos que as utilizam. Como um músculo é forte quando bem exigido, ou flácido se o braço é sedentário.

Governos são governados pela nossa vontade e regulados pela nossa atuação. Portanto, na ausência da nossa vontade e atuação, não temos direito de estranhar ausência de governo.


Só existe uma maneira de um país funcionar direito: se cada um sabe qual é seu papel de cidadão e não se furta a cumpri-lo. Somos nós que temos que fazer alguma coisa, porque não existe eles.


É importante a partir de agora me parece, começar a participar mais das grandes questões, através de filiação a ONGs ou de grupos e instituições que podem ajudar cada um de nós a ter voz e atuar mais no destino desse país.

Qualquer que seja essa participação, exerça-a. Porque que não dá mais para continuarmos sendo um povo cordeiro, abatido em rebanhos dentro de aviões que caem em aeroportos surreais, ou dentro de carros assaltados em cruzamentos por ladrões que matam por relógios. Não dá mais para continuar assistindo passivamente manobras no congresso, corrupção endêmica, desvio de verba e falta de ética. Tudo ao mesmo tempo agora.

Temos a obrigação moral de discutir, opinar, influenciar e principalmente atuar. Para mudar essa escrita.
 
A ironia é que todos querem que esse país decole.
Mas sem competência e sem a cura dessa passividade, só seremos capazes- como aquele Airbus- de um vôo de galinha que termina logo depois da cabeceira da pista.



Alexandre Gama, publicitário presidente da Neogama/BBH
 
Comentários

Criativo de Galochas - Apertem os cintos, quando algo dá errado, os governantes e toda a tripulação somem! http://criativodegalochas.blogspot.com

Ricardo Cardoso - Taí uma opinião madura, coerente e que concordo plenamente. Essa vai acabar sendo mais uma notícia, se nós, brasileiros, não tomarmos nenhuma providência, além daquela que a gente sempre toma: esquecer. Pensem nisso. Parabéns! Alexandre! ricardocardoso35@gmail.com


 Rodrigo - E fica a pergunta: Como unir todos os brasileiros em um única voz de protesto e ação contra o músculo flácido dos políticos? rodrigoalmeida_1@yahoo.com.br


 Jullis - Expor a opinião como o Alexandre fez já é legal, porque abre espaço para que mais pessoas indignadas com o que aconteceu e com o que vem acontecendo no país se manifestem. E quem sabe aí com bastante gente indignada e pressão da opinião pública alguém faça alguma coisa para impedir que novas tragédias aconteçam. Como por exemplo, mudar o fluxo de Congonhas para o aeroporto de Campinas, que tem área de escape e, ao que parece pelo que foi divulgado pela imprensa, condições reais de receber aviões.


 

Vôo 3054

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