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Coluna do W.O.

Com corpinho de 45

30.08.21

Dia 29 de setembro eu faço aniversário. Até aí, nenhuma grande novidade: faço isso todos os anos, desde 1952.

A novidade é que neste ano faço 70, idade em que alguns começam a se achar velhos. Garanto que comigo não vai acontecer.

De corpo, me sinto como se tivesse 45 anos de idade. As únicas diferenças são os cabelos, que embranqueceram ou caíram, e os óculos, que comecei a usar inicialmente para ler, depois mudei para bifocais e agora não consigo mais viver sem eles.

De cabeça, também vou bem.

Busco, diariamente, fazer o novo de novo. Me mantenho sempre antenado. Caminho e penso muito. Relembro o que aconteceu ontem e comparo com o que está acontecendo hoje.

Em 1977, existia gente que se espantava com o fato de certas pessoas viajarem de Concorde, que custava mais que o dobro da primeira classe, mas fazia Rio-Paris em apenas seis horas. Se espantavam sem razão, porque o Concorde era um avião utilizado por pessoas para quem cada minuto economizado significava dinheiro no bolso. Viajar de Concorde não era ostentação; era um bom negócio.

Em 2021, o bilionário Jeff Bezos passeou de foguete pelo espaço durante 15 minutos e divulgou o acontecimento aos quatro ventos. O passeio custou uma fortuna e até agora não gerou resultado algum. Apenas deixou claro quanto Bezos acredita no seu taco. Segundo seus porta-vozes, ele garante que, depois desse voo, conseguirá vender passeios iguais por US$ 28 milhões por pessoa. O enorme contraste social existente no mundo justifica essa crença.

Até alguns anos atrás, a maioria dos brasileiros bem-sucedidos bebia uísque. Existiam até dois bares que ficaram famosos pela qualidade dos escoceses e pelo nível intelectual dos frequentadores: o Antonio’s, no Rio de Janeiro, e o Plano’s, em São Paulo.

Hoje, a maioria dos brasileiros bem-sucedidos bebe vinho. Fato que, com o tempo, produziu um seleto grupo de connoisseurs. Mas produziu também um bando de “enochatos, que passam noites repetindo palavras como taninos, potente, estruturado, complexo, aveludado, amadeirado e buquê.

Tempos atrás, a maioria dos médicos não recomendava as bebidas alcoólicas. Hoje, muitos deles não só recomendam que se beba vinho, como indicam alguns rótulos. Aliás, costumo dizer que um médico só alcança o auge da sua carreira quando vira sommelier.

Explicando melhor: depois de anos de sacrifícios e estudos, os pouquíssimos que conseguem virar mestre, doutor livre-docente e professor titular acabam tendo clientes que gostam de presentear seus médicos com grandes vinhos. Saboreando esses vinhos, eles passam a entender do assunto e viram sommeliers amadores, sem deixar de ser médicos profissionais. Uma espécie de mistura do Manoel Beato, do Fasano, com o Francis Collins, do mapeamento do DNA.

No início da minha juventude, jogadores de futebol não se preocupavam muito com seus cabelos. Gerson, Tostão, Pelé e Rivellino cortavam os cabelos de vez em quando, mas estavam mesmo preocupados em jogar bola. E como jogavam.

Nos dias de hoje, cabelos são assunto prioritário dos nossos futebolistas. Segundo comentam, a delegação da seleção brasileira que foi para o Mundial da Rússia tinha mais cabeleireiros que fisioterapeutas. Quanto ao futebol que aquela tão bem penteada equipe praticou, há controvérsias.

Antigamente, homens casados com mulheres bonitas preferiam que elas não se expusessem usando vestidos muito curtos, blusas com decotes exagerados ou calças coladas no corpo.

Hoje, muitos homens casados com lindas mulheres tiram fotos delas de biquíni, fazendo poses sensuais, divulgadas via Instagram tanto pelo marido quanto pela mulher. Curiosos tempos de evasão de intimidade.

Até pouco tempo atrás, presidentes da República não chamavam seus adversários de “filho da p*ta”, como fez recentemente o atual presidente, provavelmente com a intenção de se mostrar macho na atitude e moderno no linguajar para seus seguidores.

Errou na mosca. Berrar “filho da p*ta” não é atitude nem linguajar adequado para quem quer que seja.

E macho e moderno mesmo é o Ney Matogrosso, que acaba de fazer 80 anos, mais jovem do que nunca.

Um dia eu chego lá.

Washington Olivetto
Publicitário

washington@washingtonolivetto.com.br

Texto publicado no jornal O Globo

Leia texto anterior da Coluna do W.O.aqui.

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