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Festival do Clube 2019

e-Sports: marcas ainda precisam aprender a jogar

27.09.19

A primeira pergunta feita no painel “e-Sports: A vez dos anunciantes” deu o tom do debate sobre a modalidade que arregimenta multidões de fãs e desperta o interesse cada vez maior do mercado. O mediador Rodrigo Capelo, jornalista do Globo Esporte e do SporTV, questionou os participantes como marcas não-endêmicas - ou seja, aquelas que não fazem parte do contexto dos games - podem se inserir nesse segmento e se comunicar com o público corretamente.

Lucas “Marduk” Rampinelli, head de e-sports do grupo Webedia e um dos ícones da comunidade do jogo de cartas Hearthstone, deu a resposta que mais ressoou entre seus companheiros de palco: oportunidade. Elas começaram a surgir quando produtoras e publicadoras de jogos eletrônicos passaram a investir não só em competições, mas também em entretenimento como reality shows e eventos não-competitivos. A estratégia deu segurança para o mercado. “Ainda assim, pouquíssimas marcas não-endêmicas investem no cenário. São três ou quatro, no máximo.”

Para Bernardo Mendes, game specialist da Cheil Brasil, as marcas precisam deixar para trás a mentalidade de que videogames são coisas de criança. “Se analisarmos os demográficos, o gamer tem filho, não mora mais com os pais, não é mais a garotada. Obviamente, ainda tem jogos pra garotada, mas a maioria dos gamers cresceu e tem poder aquisitivo pra comprar um carro”, disse. “Mas não tem marcas falando com esse público da maneira que eles gostariam”.

Quem entende e quem não entende

Bernardo explicou que a comunidade de jogadores percebe quando uma empresa não entende o mercado. “É bom ter em mente que o cenário de esporte eletrônico existe desde a década de 1970. Então, não é algo muito novo. Tem muita gente fazendo muita coisa há muito tempo. Se a gente encara isso como novidade, o público gamer sabe que não é novidade”.

Rob Vitorino, e-Sports Communications Manager da gigante Ubisoft, publicadora do jogo Rainbow Six Siege, que tem 50 milhões de jogadores no mundo, concordou: “A gente que publica o jogo tá validando (com o público), preocupado com o que o público quer ver. A marca que está vindo de fora tem de validar duas, três vezes mais porque ela é outsider."

Sobre a inserção dos anunciantes de fora do universo dos jogos, Bernardo mencionou o Campeonato Brasileiro de League of Legends (CBLOL), que teve sua primeira edição em 2012, mas só recentemente uma marca não-endêmica, a Gillette, demonstrou interesse em fazer parte do evento. A empresa se tornou patrocinadora do CBLOL em 2018. A final do campeonato deste ano, no Rio de Janeiro, no dia 7 de setembro, reuniu cerca de 10 mil torcedores para acompanhar as equipes Flamengo e INTZ na disputa pelo título. A patrocinadora fez lançamento de um produto na decisão.

O que é preciso fazer, então? “O primeiro contato de uma marca não-endêmica, que entra como outsider nesse mercado, tem de considerar adicionar esses meninos e meninas na lista de amigos antes de desenvolver produtos”, recomenda Marduk. Um exemplo prático desse posicionamento é o que fez a rede de restaurantes Wendy’s, que realmente fez parte da comunidade ao desenvolver um avatar no game Fortnite e participar do jogo, atraindo outros gamers em sua ação. A estratégia conferiu à rede o Grand Prix de Social & Influencer no Cannes Lions 2019, com o case “Keeping Fortnite Fresh”, criado pela VMLY&R de Kansas (relembre aqui).

Marduk trouxe também um recorte social para a questão. É preciso compreender quem são, de fato, os gamers, e quem é o boss da fase que enfrentam. Estão nessa conta a descredibilidade, o preconceito e o machismo que existe nesse segmento de várias maneiras. O comentário abriu espaço para um debate sobre a presença feminina no meio gamer. Os três especialistas concordaram que há um grande número de mulheres, mas o universo gamer reproduz o sexismo da sociedade. "Tem-se feito muita propaganda para que mude, mas, quando você entra no jogo, não mudou nada”, criticou Bernardo.

Atual campeão brasileiro de League of Legends, a equipe do Flamengo serviu como parâmetro para os painelistas relacionarem os esportes eletrônicos com os tradicionais, como o futebol e as modalidades olímpicas. Segundo Bernardo, o futebol vem perdendo público jovem pois está envelhecendo e não acompanha as tecnologias modernas. Além disso, há o lado da violência. Para ele, parte dos fãs não quer acompanhar partidas de futebol nos estádios, ou vestir camisas de times, por medo da violência – um medo que não existe nos e-sports.

Indo além de questionar se e-sports são esportes reais - “se você precisa perguntar isso, não deveria estar aqui” disse Rodrigo Capelo, na abertura do painel -, o ponto de discussão foi se é válida a inserção dos esportes eletrônicos nas Olimpíadas.

O mercado de jogos é muito volátil. Quatro anos no mercado é insano”, assinalou Bernardo. Segundo ele, é muito complexo para o setor de videogames participar de Olimpíadas. “É uma questão de como o Comitê Olímpico vai trabalhar e convencer as publicadoras de que esperar quatro anos é o correto. O videogame não precisa das Olimpíadas", completou.

 

Danilo Telles

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