arrow_backVoltar

No London International Awards

Ex-CCO da Droga5 fala sobre acusações de assédio sexual

08.10.19

Mais de um ano e meio depois de ter sido demitido da Droga5, após alegações postadas pela conta anônima do Instagram Diet Madison Avenue (leia aqui), o ex-chief creative officer da agência em Nova York Ted Royer esteve à frente de de uma palestra em Las Vegas, durante o Creative Liaisons, programa de jovens talentos do London International Awards.

"Estou aqui porque acredito na comunicação cara a cara e não quero mais me esconder", comentou em uma sala de conferências cheia de jovens criativos globais do programa, além de executivos da indústria, jurados da edição de 2019 do LIA.

De 2012 até quando deixou a Droga5, Royer havia sido palestrante regular do Creative Liaisons. Suas apresentações anteriores tinham se centrado em conselhos para talentos promissores. Esse ano, ele continuou compartilhando dicas, mas também aproveitou a oportunidade para se abrir sobre suas próprias experiências durante e após as alegações da DMA.

"Minha agenda de hoje será sobre eventos que me levaram a deixar a Droga5, que resultaram na minha demissão, e quero lhes contar porque quero colocá-los no contexto durante o ano e meio que se seguiu e as coisas que aprendi. Acredito desde então que esses acontecimentos me levaram a uma vida mais forte", disse Royer.

Antes disso, nenhum dos criativos que foram acusados ​​de má conduta nas postagens da DMA nas mídias sociais havia falado publicamente de forma mais aprofundada sobre suas experiências - embora ao menos o ex-CCO da The Martin AgencyJoe Alexander, tenha divulgado uma declaração sobre as ações da DMA alegando que as acusações acabaram com sua "reputação", sem lhe dar a chance de se defender, como parte de um processo que ele abriu no mês passado contra os indivíduos por trás da conta anônima e contra a Adweek (leia aqui).

"Vivemos em um país que possui leis que permitem ao acusado o direito de enfrentar o acusador", comentou a fundadora e presidente da LIA, Barbara Levy, sobre o motivo pelo qual convidou Royer a voltar para falar. "Não acredito que uma plataforma de mídia social anônima que não permita que o acusado responda deva poder indiciar, tentar condenar alguém."

Royer, visivelmente desconfortável às vezes, agradeceu à platéia. "Quero realmente reconhecer os contatos, os jovens criativos que não me conhecem, mas que podem me conhecer por minha reputação, tanto boa quanto recentemente horrível", comentou o ex-CCO. "Quero agradecer por me ouvir e me dar uma chance hoje."

A parte inicial do discurso abordou as postagens e as declarações que a DMA fez antes de sua partida da Droga5. Slide a slide, ele analisou as várias alegações, incluindo uma postagem que colocou seu nome no topo de uma lista de outros supostos assediadores do setor.

"Esse foi o pior dia da minha vida, de longe", contou, dizendo que estava em Los Angeles em uma sessão de fotos, acompanhado por sua família, quando viu o post pela primeira vez. "Era início de 2018 e acho que todos vocês se lembram da atmosfera, estávamos querendo expulsar assediadores sexuais em todos os lugares e eu me encontrei no topo. Foi um dia brutal."

Outra série de postagens da Diet Madison Avenue centrou-se em como os acordos de confidencialidade ajudam a silenciar as mulheres e a proteger homens poderosos no setor de publicidade.

"Eu li isso a caminho do trabalho", disse Royer. "E eu tive duas reações. Uma delas foi: 'Isso absolutamente não é verdade'. Nunca estive envolvido em um acordo de confidencialidade com uma mulher. Eu nunca estive envolvido em uma discussão sobre a carreira de qualquer mulher relacionada a algo pessoal sobre mim... Fiquei realmente feliz quando vi isso. Eu fiquei tipo, 'oh, isso é comprovadamente falso'. Mas quando cheguei ao trabalho, pude ver o impacto que isso causava no rosto das pessoas."

Ele lembrou que a agência logo o colocou em licença e contratou um escritório de advocacia para investigá-lo (aqui). "Eu não sei se você sabe o que acontece quando esses escritórios de advocacia o investigam", disse. "Eles passam por todas as comunicações sobre você que podem encontrar - e-mails que você mandou e recebeu, mensagens de chats que você manda, que você recebe e que citam você."

Royer então revelou alguns dos comportamentos que a investigação descobriu, detalhes que nunca haviam sido incluídos em relatórios anteriores sobre sua demissão. "Eu era irreverente, fiz piadas, sou provocador, incentivei o uso de drogas e bebidas", destacou. "E eu acreditava na velha noção criativa de que você tem que festejar muito e fazer um grande trabalho para ser alguém notado neste setor. Eu certamente me comportei de maneira egoísta e imatura", reconheceu.

Royer apresentou um slide final do DMA, sem dúvida o mais danoso, no qual uma pessoa que afirma ser uma de suas subordinadas, detalhara um suposto encontro não consensual. "Esta é uma história, supostamente sobre eu atacar uma garota no corredor da agência", contou, visivelmente emocionado. "Isso fez com que ficasse muito, muito difícil me defender... Conversei com centenas de pessoas depois e muitas se lembraram dessa história e acreditaram nela... Mas essa história não é verdadeira. Se é verdade, não é sobre mim. Em absoluto. Eu nunca agi assim. Mas isso ficou grudado em mim como cola."

Royer afirmou que, depois disso, a investigação continuou e profissionais foram chamados a se apresentar e ele foi demitido. "Não sei o que disseram. Não me contaram nada. Nunca tive a chance de abordar essas preocupações. E fiquei bastante arrasado."

As notícias da investigação e sua demissão subsequente nunca revelaram por que o contrato com Royer foi encerrado. A agência emitiu apenas uma única declaração: "Estamos comprometidos em manter um ambiente seguro e inclusivo para todos os nossos funcionários".

No restante da conversa, Royer contou o que está fazendo desde que deixou a Droga5. O profissional afirmou que passou o último ano e meio conversando com "centenas" de pessoas, homens e mulheres, sobre seus relacionamentos com ele, bem como sobre suas próprias experiências relacionadas ao tema "assédio". "Foi incrivelmente revelador", disse. "O movimento MeToo (...) é vital e necessário, e as mulheres que eu conheço, incluindo minha esposa [Suyin Sleeman, também criativa da publicidade], passaram um período terrível neste setor. A coisa mais comum [que eu ouvi] foi sobre os 1.000 pequenos cortes que as mulheres sentem todos os dias, coisas que as lembram de seu gênero e de sua alteridade."

Ele também disse que passou o tempo trabalhando como freelancer e concentrando-se em "retribuir" ao mercado, incluindo a criação de comunicações para uma entidade chamada Freedom to Choose Project, que desenvolve programas para ajudar a melhorar a vida de indivíduos encarcerados e carentes.

"Entrei nas prisões femininas e falei com elas, e as histórias são surpreendentemente semelhantes", disse ele. "Uma mulher contou que foi repassada pelos membros de sua família, o que leva a drogas e abuso de álcool, o que leva a cair em um ambiente ruim, geralmente com um homem abusivo, o que leva a cometer um crime, que leva à prisão". O programa, no entanto, não trata apenas de conversar sobre as encarceradas, mas de falar "com elas", emendou Royer.

"Realizamos workshops onde somos todos iguais e aprendemos mesmo com elas. Uma prisioneira reformulou meu relacionamento com meu pai em 20 minutos e isso me surpreendeu."

Royer disse que também está trabalhando com agências. Ele descreveu a possibilidade de participar de um evento freelancer em uma pequena agência, mas depois descobriu que uma mulher disse: "Não vamos deixar esse monstro entrar no prédio."

"Eu estendi a mão para ela", afirmou. "Eu tomei um café com ela e conversamos por duas horas. E tenho orgulho de dizer que ela é uma amiga agora. Escrevemos quase todos os dias, temos debates intensos sobre feminismo e masculinidade tóxica e tudo isso, mas é uma das melhores amizades que fiz recentemente. Isso realmente solidificou para mim o poder da comunicação face a face."

Em outubro do ano passado, surgiram relatos de que Royer havia sido contratado "discretamente" pela DDB para trabalhar como freelancer, o que gerou uma reação contra a CEO Wendy Clark, que acabaria deixando o cargo de uma das líderes da iniciativa Time's Up Advertising.

"Se você é a jovem que trabalha na DDB e eu entro, é claro que você vai surtar", disse. "Claro que você vai surtar, e eu entendo isso."

As conversas e os vários projetos que ele realizou nesse período ensinaram a importância de três coisas principais: "comunicação, compreensão e empatia", comentou.

Quando o AdAge perguntou a Royer se ele acreditava que algo de bom resultou daquilo que a Diet Madson Avenue fez, ele respondeu: "O bom resultado disso foi que certamente estamos muito mais conscientes do [assédio] como indústria, e isso é fantástico. Certamente, muitas empresas começaram a ver o que fizeram e estão fazendo, e isso também é fantástico. E acho que o ímpeto por trás da Time's Up Advertising veio por causa da Diet Madison Avenue".

A empatia que ele disse que pratica se estende até a DMA. "Não acho que sejam pessoas horríveis", declarou. "Acho que todo mundo está tentando fazer o melhor que pode com o que tem. E aposto que, se alguma vez conheci alguém da Diet Madison Avenue, provavelmente está sentindo muita dor. A raiva vem da dor". E acrescentou: "Eu encontraria as pessoas da DMA pessoalmente e conversaria com elas, ouviria sobre a sua dor e de onde vem a raiva."

"Não conheço ninguém que me acusou, mas eu quero conhecer", destacou. Inúmeras vezes, durante toda a apresentação, ele incentivou o público, ou qualquer pessoa que ache que foi prejudicada por ele, a entrar em contato por e-mail em tedroyer50@gmail.com para, possivelmente, ter uma conversa face a face.

"Se eu prejudiquei alguém, quero focar nessas pessoas e corrigir isso", comprometeu-se. E também pediu perdão. "Peço desculpas à minha esposa, que é mais forte do que eu jamais imaginei", disse ele. "Não gosto da maneira como a Droga5 me tratou, mas adoro essa empresa e peço desculpas se trouxe qualquer vergonha e mágoa. E peço desculpas à indústria que amo. Sou um dos seus principais vilões no momento e isso dói muito porque eu amo esse setor e quero ajudá-lo. Não estou aqui por absolvição. Não estou aqui para dizer que está tudo bem agora, mas quero que isso seja um começo."

O público teve reações contraditórias ao discurso de Royer. Várias participantes do sexo feminino, algumas visivelmente nervosas, o questionaram durante a sessão de perguntas e respostas, uma delas perguntando sobre suas motivações para se apresentar naquele momento.

"Primeiro, fui convidado", disse ele. "Eu queria conversar com pessoas que não conhecia. Queria conversar com criativos, porque as coisas que aprendi e tentei incorporar ao longo do último ano e meio são muito relevantes para jovens criativos."

Leia a matéria do AdAge na íntegra aqui.

No London International Awards

/