arrow_backVoltar

Festival do Clube 2021

Carlos Saldanha: das ideias simples até o sucesso mundial

04.10.21

Trabalhando e morando nos Estados Unidos há mais de 30 anos, o carioca Carlos Saldanha é certamente um dos maiores nomes da animação mundial. Com “A Era do Gelo 2” e “A Era do Gelo 3”, ele tem dois dos filmes mais premiados da história do cinema, e recentemente se aventurou nos live actions com “Cidade Invisível”, exibida na Netflix.

Em painel na 9ª edição do Festival do Clube de Criação, ele trocou ideias com Francesco Civita, sócio e CEO da Pródigo Filmes, que produziu a série e mostrou como é possível, a partir de ideias simples, surgir um fenômeno mundial.

Saldanha falou sobre seu início no mundo das animações, quando foi para os EUA fazer mestrado na área. Apesar de tamanho empenho, revelou que nunca planejou ser diretor e fazer filmes. Apenas viveu um dia de cada vez e aproveitou as oportunidades que se apresentaram.

Haja oportunidades. Um de seus grandes filmes, “Rio”, teve início com uma notícia de que pinguins estavam chegando em Ipanema. Ele contou que um dia estava nadando na praia e apareceu um espécime ali. Então, imaginou como se sentiria o pinguim num país tropical. Essa foi a origem da história, que se desdobrou de outra forma. “É um processo longo. Foram mais de seis anos desde que comecei a trabalhar na ideia até concluir o filme.

Sucesso de público no Brasil com uma narrativa carregada de mitologia e inspiração folclórica, “Cidade Invisível” chegou ao top 10 em mais de 40 países. Assim como “Rio”, a série da Netflix, que tem Marco Pigossi e Alessandra Negrini, também surgiu de uma ideia simples.

De acordo com Saldanha, essa semente foi pensar em como seria se aparecesse um boto cor de rosa em Ipanema. “Passei a pirar na ideia de essas entidades invisíveis viverem entre a gente, que fossem pessoas como nós e tivessem dilemas como nós. Vivem uma maldição de estar naquela roupagem, aquela sina de que à noite vai virar outra coisa.

Ainda sobre a série, Civita perguntou como foi a negociação com a Netflix. Saldanha respondeu que queria muito fazer uma história brasileira, mas com roupagem adulta, atingindo um público mais velho. “Queria fazer um filme policial, de ação, completamente diferente do que já fiz. Mas não consegui abandonar o elemento fantástico das histórias que já fiz. A animação permite trabalhar com elementos da física e do fantástico. Mesmo no policial sempre quis trazer uma coisa mais mística e o Brasil tem isso.”

Em relação ao trabalho com a gigante dos streamings, o diretor observou que “nenhum projeto é você sozinho; sempre é uma equipe”. Ainda que seja uma indústria, com grandes estúdios investindo milhões, Saldanha disse que garantiu que sua visão criativa fosse respeitada, pois todos pensaram em fazer o melhor projeto criativo possível.

Colaboração é muito importante. Você divide a ideia com produtores e discute junto”, disse. Faz parte do processo lutar por uma ideia e perder, mas algumas vezes é possível ganhar, ressaltou. “Você tem de deixar o projeto ser o que tem de ser.”

Com a expansão das plataformas de streaming, o setor de audiovisual ficou aquecido, pontuou Civita. “O mercado brasileiro é economicamente verdadeiro. Antes dependia de incentivos, mas agora tem players interessados em desenvolver projetos focados para o brasileiro”, reforçou.

Saldanha afirmou que, por causa de sua experiência até então exclusiva nos Estados Unidos, temia que os profissionais não fossem dar conta da produção de “Cidade Invisível”, mas se surpreendeu. “Isso é reflexo de alguns anos de projetos que geraram boas experiências. Se agora está assim, em uma indústria na sua infância, daqui a 5, 10 anos, a gente vai estar em outro patamar, disse.

Ele completou, destacando que, no início, era difícil: não havia roteiristas, faltavam pessoas. “Agora bastam dois ou três anos para formar uma nova equipe, para ter novos talentos surgindo. Mas nada é muito rápido, como o ‘Rio’ que levou dez anos sendo feito.

O diretor espera que o país consiga receber projetos de fora para serem filmados aqui.Acho que o Brasil pode virar um grande centro de produção.”

Quanto a seu processo criativo, Saldanha comentou que é parecido com o da publicidade: “Você começa a trabalhar numa semente de ideia. Elas vão germinando e você passa a desenvolver. O processo criativo vai evoluindo e chegando aonde tem de chegar.”

Para a nova geração, o diretor deu conselhos. De acordo com ele, o mais importante é querer aprender. “Nunca se começa no topo, mesmo que se tenha o melhor estudo. Isso não dá a vivência necessária. A experiência é muito importante e a vontade de aprender é melhor ainda”, recomendou.

Não deixe de dar valor às pequenas coisas, cada projeto tem algo a ensinar. Quando tiver uma oportunidade, você usa tudo o que aprendeu”, emendou. “Você pensa no futuro e não no agora. O agora é para te levar para aquele futuro.”

Civita aproveitou para também passar um pouco de sua experiência. Segundo ele é preciso saber seguir seus parceiros, não apenas com sua equipe. “Na propaganda, o cliente deveria ser seu parceiro. Você precisa enxergar aquela pessoa como parceiro, que também faz parte do processo colaborativo."

Perguntado sobre o que pode vir para a segunda temporada de “Cidade Invisível” – que foi confirmada em março pela Netflix –, Saldanha deixou a expectativa de que talvez ainda vejamos muito mais daquele universo de fantasia.

É sempre difícil fazer uma sequência. Quando você pensa em 'fazer um 2', você tem um tronco de um personagem com o qual você já tem uma conexão. É um personagem que todo mundo já conhece, e isso tem um dilema: 'qual vai ser a próxima história desse personagem?'. Parece simples, mas é muito difícil”, confidenciou.

Além disso, é preciso trazer personagens novos e isso pode gerar “uma escolha de Sofia”, declarou. Isso porque, para trazer um personagem, às vezes tem de se eliminar outro. “Fico muito apegado aos personagens; é difícil deixar ir. Mas com os streamings tem uma coisa maravilhosa que são os spin offs. Então, você pega um personagem, tira daquela história e coloca numa outra ramificação da história”, concluiu.

Danilo Telles

Todos os painéis do Festival do Clube 2021, realizado entre os dias 22 e 23 de setembro, foram transmitidos pelo Globoplay. O evento deste ano foi gratuito.

O conteúdo do Festival já está disponível na plataforma de streaming. Até o dia 27 de outubro - acesse a partir daqui.

Reveja a programação completa aqui.

Leia anterior - Pancho Cassis: o futuro da publicidade precisa de brasileiros

Festival do Clube 2021

/