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Elas Perguntam, Elas Respondem

Gláucia Montanha (Convert) e Nathalia Cruz (Porta dos Fundos)

09.03.21

O Clubeonline abriu um espaço para a troca de experiências, ideias, dúvidas e reflexões sobre a mulher no mercado de comunicação.

Para isso, montamos duplas formadas por profissionais que nunca trabalharam juntas antes. A experiência visa mostrar o que evoluímos e discutir para onde vamos. Afinal, se tomarmos como base que a mulher “chegou lá”, o que vem a seguir?

O mais importante nesta proposta é a troca entre as profissionais convidadas. Para isso, elas tiveram liberdade de estabelecer três perguntas para sua “dupla”. E responderam às três encaminhadas por ela.

A série foi inaugurada nesta segunda-feira, 08, Dia Internacional da Mulher, com Ilca Sierra (Via Varejo) e Lica Bueno (Suno) – leia aqui como foi a troca de perguntas.

Agora é a vez de Gláucia Montanha, diretora-geral da Convert (do Grupo Dreamers, dono da Artplan e do Rock in Rio, entre outras empresas), e Nathalia Cruz, atriz e roteirista do Porta dos Fundos.

Até sexta-feira teremos uma dupla por dia.

GLÁUCIA MONTANHA

Formada em Administração e Comunicação Social, Gláucia soma mais de 20 anos no mercado publicitário, tendo atuado nos mais diversos segmentos. Nos últimos anos, tem pautado sua carreira em brand performance, performance, métricas e e-commerce. Em outubro passado, Gláucia assumiu como diretora-geral da Convert, unidade de negócios de digital business e performance do Grupo Dreamers (relembre aqui).

Antes, liderou por três anos a área de Mídia, BI e Performance da VML&Y&R, comandando mais de 60 profissionais. Ela estava na agência desde 2004.

As questões enviadas por Nathalia Cruz e respondidas por Gláucia Montanha são as seguintes:

Nathalia - Depois de tantos anos de carreira e ocupando um cargo de liderança à frente de tantos colaboradores, como você faz para se manter sempre ligada ao novo? O que você mais valoriza na troca com quem está começando?

GLÁUCIA - Existem algumas coisas que me ajudam nisso. As mais importantes que destaco aqui são: empregabilidade, relevância e saber que preciso aprender todos os dias. De forma bem simplista, vou explicar rapidamente a importância de cada uma dessas. Devido à minha história de vida, de sempre precisar ajudar em casa, tinha muito medo de ficar desempregada quando comecei, e isso despertou em mim uma inquietude que até hoje me persegue. De certa forma, é uma das coisas que mais me ajudou a chegar até aqui, e me manter. Para mim, empregabilidade está ligada a se manter atualizada em relação aos principais movimentos que acontecem, seja para buscar ter talentos melhores do que eu ao meu lado para aprender, ou para criar uma rotina semanal de aprendizagem. Isso me permite passar por assuntos e reconhecer o quanto não sei, pois surgem novas frentes de aprendizado todos os dias. Esse movimento impacta diretamente no segundo, que é a relevância. Tenho a relevância como principal objetivo em cada cliente, buscando fazer diferença positiva no dia a dia do negócio dele, entregando além do que podem parecer “commodities”. Busco, de verdade, entender o negócio dele e saber como posso, de fato, ajudar a gerar mais negócios e isso me mantém em uma rotina constante de conversa e de busca por oportunidadesPor isso, quando conheço alguém que está começando, o que mais valorizo é a conversa, porque cada conversa me abre uma série de novas possibilidades. E é menos sobre a conversa de trabalho e sim sobre a pessoa. De repente, quando percebo, estamos em uma troca muito interessante.

Nathalia - Entre tantas especializações em análise de performance e métricas de resultados para clientes, você costuma ser mais ou menos exigente no monitoramento de seus "resultados" pessoais nos papéis sociais que ocupa? Nossa autocobrança, principalmente como mulheres, costuma ser severa. Consegue ser generosa na hora de fazer essa autoanálise?

GLÁUCIA - Nossa, uau, que pergunta! Óbvio que, quando analiso meu resultado versus tudo o que poderia fazer como papel social, posso dizer que estou abaixo na performance, levando em consideração o tamanho de tudo que gostaria de fazer. Mas aprendi a ser feliz e comemorar onde consigo estar. Quando mudei isso na minha cabeça, acredite, parece que comecei a fazer mais coisas. Parece que quando você diminui a cobrança consigo mesma, você faz mais por você. É algo bem especial, onde aprendo que o primeiro passo é aceitar que está tudo bem se não conseguir fazer tudo, mas que amanhã está aí para poder tentar de novo. Já sofri muito com a autocobrança e hoje consigo ser mais leve nesse olhar, mas diria que isso foi um pouco da maturidade e, principalmente, a diminuição do ego, que vem no pacote “maturidade”, a meu ver.

Nathalia - Após mais de 20 anos de carreira e em meio a tantos desafios e conquistas, você acha que o ambiente corporativo em que atua hoje é mais receptivo à presença de mulheres em cargos de liderança? Qual o conselho que se daria se pudesse falar com a Gláucia do começo da carreira?

GLÁUCIA - Hoje a conversa sobre mulher na liderança é mais comum, mas ainda com um olhar social. Algo como “precisamos ter mulheres na liderança”. Muito mais para cumprir o papel com a sociedade do que pela real entrega e formação. De qualquer forma, já acho um avanço, pois fui parte da época em que a mulher na liderança era mais um símbolo sexual do que de líder, e hoje já evoluímos. Óbvio que ainda tem muito para evoluir e, diariamente, precisamos lembrar do nosso papel e entrega, seja na empresa, na sociedade ou no ambiente de amigos, mas com mais naturalidade do que antes. Agora, sobre o conselho, quando olho tudo o que passei, duas dicas eu daria: “Acalma o cérebro! Você vai chegar mais longe do que imagina. Então, sinta menos culpa pelas coisas que acredita que está perdendo agora, porque elas virão de uma forma ainda mais especial”.




NATHALIA CRUZ

Formada no Tablado, escola de teatro fundada em 1951 no Rio de Janeiro pela escritora e dramaturga brasileira Maria Clara Machado, Nathalia ocupa hoje a sala fixa de roteiro do Porta dos Fundos e atua em alguns vídeos do canal. Entre seus destaques, foi roteirista e elenco de vídeos como "Cota", "Não Mente" e “Nota de Repúdio”.

Em 2020, apresentou o 4º Prêmio ABRA de Roteiro ao lado de Nany People. Fez parte do time de humoristas que estrelaram "Teocracia em Vertigem", último especial de Natal do grupo (leia mais sobre a produção aqui). Também atuou na terceira temporada da série “Homens”.

As questões enviadas por Gláucia Montanha e respondidas por Nathalia Cruz são as seguintes:

Gláucia - Como se destacar em um segmento (humor) que nasceu e cresceu, durante anos, usando a mulher como foco das piadas e sempre em menor posição? Qual foi o seu maior desafio

NATHALIA - Acredito que o desafio é constante. Mudar o alvo das piadas é uma tarefa coletiva e a possibilidade de se autoproduzir e promover, que a internet proporciona, certamente foi fundamental para a disseminação dessas novas vozes femininas dentro do humor. Roteirizar piadas com a perspectiva feminina é desafiador, porque esse universo é desconhecido pela maioria (homens) que ocupa o segmento. Então, muitas vezes antes de apresentar a graça, precisamos emprestar nossos óculos para que eles se coloquem no nosso lugar e consigam entender de onde vem nosso riso. A gente cresceu rindo do que os homens faziam e falavam que era engraçado. Então, não deixa de ser uma reconstrução interna também. Tem dias que essa pedagogia é mais cansativa, mas sempre vale a pena.

Gláucia - Você tem algum sentimento de culpa por ter chegado até aqui? Muitas pessoas acham que nós mulheres quando chegamos em cargos altos é porque abrimos mão de algo como família, filhos, amigos. Por outro lado, para homens isso nunca é perguntado. Como você traduz isso?

NATHALIA - Essa é uma lógica bem perversa para nós, mulheres, né? Por mais entendedoras que sejamos de toda a estrutura machista e ultrapassada que há por trás dessa culpa da mulher bem-sucedida, é algo que pesa no fim do dia. Eu vivo questionando a minha vontade de ser mãe, mas sei que, no fundo, o medo é de ter que escolher entre a carreira e a maternidade. O que ajuda é olhar em volta e identificar as milhões de mulheres fodas que teimaram em construir trajetórias próprias no contrafluxo do que se esperava delas. Isso costuma me inspirar e me conectar com as minhas vontades e sonhos fora da culpa por realizá-los.

Gláucia - Piada com homem, neste momento em que muitas mulheres lideram a renda das famílias, vale? Por que não fazemos tanto isso? Seria um sentimento maior de fraternidade? Amor?

NATHALIA - Para mim, super vale tirar uma onda com o modelo de homem que, na vida real, tem a faca e o queijo na mão todos os dias. Acho que o menor número de piadas que ridicularizam arquétipos masculinos se deve também ao fato de ainda termos menos oportunidades de falar e, por isso, quando surge a chance temos de escolher entre todos os temas do nosso mundo que podem gerar humor. O homem é apenas mais um deles. Lembrando que ainda vivemos num mundo em que os donos dos veículos, das produtoras, das marcas e de tantas outras janelas de comunicação são homens. Convencê-los de que hoje a piada são eles é quase sempre dar tiro n’água. Mas oh, na corrida por fora, das geradoras de conteúdo independentes, tem muita mina falando de mano de forma hilária.

Amanhã tem mais uma dupla!

Elas Perguntam, Elas Respondem

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