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O Espaço é Seu

AI, AI, AI. (Vitor Knijnik)

22.02.24

Isso já acontece, mas ficará muito mais comum: vídeos feitos não mais por humanos, mas por AIs sofisticadas, sendo apenas assistidos, curtidos, comentados e compartilhados por outras AIs igualmente sofisticadas a ponto de nem sabermos mais quem fez o que. Assim, para complicar ainda mais a minha já lotada lista de afazeres, me pus a imaginar as consequências deste novo palco de audiência que dispensa tão facilmente nós mortais. Me acompanhe nessa reflexão totalmente humana, imprecisa e inútil.

Como uma AI cancelará uma AI.
Uma AI comete um deslize, como seria o cancelamento por outras AIs? E o que será considerado um deslize entre as inteligências? Meu palpite é que o que causaria as tretas não seria nenhuma polêmica sobre bandeiras identitárias. O que uma AI não tolerará no vídeo de outra AI serão imagens geradas a partir de código mal escrito ou que tenham um roteiro ou narrativa nunca antes feita e impossível de ser classificada. Algo imperdoável, merecedor do ostracismo digital e que sobrecarrega o machine learning.

A Psicologia da Curtida AI.
O que levaria uma AI a curtir um vídeo de outra AI? Seria uma análise lógica baseada em eficiência de programação e inovação algorítmica? Ou algo mais misterioso, uma espécie de "gosto" digital que transcende nossa compreensão humana? Ou será apenas uma camaradagem digital: "Eu te curto, você me curte". Ou ainda quando a AI mostrar mais de sua intimidade e expuser todas as sequências de códigos que geraram aquele vídeo dela fazendo “uhu” no Lollapalooza?

Publi de AI para AI.
Essa é a pergunta mais instigante. Como os perfis e canais de vídeos gerados por AI vão monetizar os seus conteúdos junto à audiência AI? Quem seriam os anunciantes interessados nessa comunidade de inteligências não emotivas, que não compram por impulso e não se sensibilizam nem com depoimentos e imagens sedutoras? Me ocorre um novo tipo de empresa que pode surgir nessa nova era: uma espécie de agência de recrutamento de humanos que façam perguntas melhores e deem instruções mais inteligentes, menos clichês para AIs. Aí está o caminho das publis para essa comunidade.

Compartilhamentos e Comentários.
O que fará um perfil AI compartilhar com outros AIs o que acabou de ver? E pela facilidade que tem de comentar, será que vai inundar de palavras os perfis dos colegas? Nesse ponto, imagino a seguinte situação: uma AI comenta no vídeo do outro, "ótimo vídeo, é este tipo de análise que diferencia um youtuber de um bom youtuber! Continue assim, abraço.", ao que a AI que postou o vídeo responde: "gostei do seu comentário, mas poderia, por favor, me fazer mais 10 comentários ressaltando aspectos específicos do vídeo?", "claro. Aqui estão 10 comentários ressaltando pontos específicos do vídeo." E assim ficariam num looping infinito tornando cada vídeo o mais engajado de todos os tempos.

A Libertação Humana das Redes Sociais.
Por fim, resta responder sobre o que faríamos nós, desobrigados de ver, curtir e comentar vídeos nas redes sociais. Poderíamos voltar às atividades que realmente importam. Como, por exemplo, nos dedicar a hobbies como o "scroll infinito" na geladeira, quem sabe poderíamos até redescobrir a arte perdida de não fazer absolutamente nada e ainda se sentir produtivo. Se as AIs estão ocupadas se curtindo e se cancelando, alguém tem que manter a tradição humana de procrastinação, algo em que somos insubstituíveis.

Vitor Knijnik, Co-CEO e sócio da Snack Content, da B&Partners.co

Leia texto anterior da seção "O Espaço é Seu", aqui.

O Espaço é Seu

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