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O Espaço é Seu

A Tocha Olímpica é nossa

02.07.12


Fiz parte do time da WMCcann que foi conferir de perto os preparativos para a Olimpíada de Londres, que começa daqui a menos de um mês. Foi uma oportunidade rara para aprender o que pode ser feito em 2016 no Rio – e, principalmente, o que não fazer.



Fizemos várias visitas e reuniões com empresas envolvidas na organização, entre elas a McCann London, agência responsável pela comunicação dos Jogos Olímpicos 2012. Mas o objetivo principal era acompanhar o Revezamento da Tocha Olímpica, símbolo que é sinônimo dos Jogos para qualquer mortal. E, se analisarmos sob outro ponto de vista, deve ser o viral mais antigo do mundo, junto com a estrela de Belém.



Em maio, a Tocha foi acesa na Grécia, conforme se faz desde a Antiguidade, quando as sacerdotisas no Templo de Hera, em Olímpia, acendiam o fogo sagrado. Desde então, a Tocha está sendo conduzida por diversos atletas e cidadãos comuns até Londres. Em território grego, foram 2.900 km, passando por quinhentas mãos diferentes. Agora, ela está no meio de seu trajeto de 13.000 km, já em território britânico. Quando chegar ao fim, o revezamento terá sido feito por 8.000 pessoas.



Tradição e história à parte, do ponto de vista dos patrocinadores, trata-se de uma das propriedades mais valiosas que um anunciante pode querer ter. Para o comitê organizador de Londres, particularmente, o Revezamento da Tocha tem uma função estratégica que é contagiar o resto do país em relação ao evento. Para os britânicos em geral, a Olimpíada é de Londres, não da Grã-Bretanha, o que faz necessário um plano de ação para que os outros países do Reino Unido se envolvam no evento.



Convenhamos, não é uma tarefa fácil, considerando o temperamento do povo. Em 2016, o comportamento aqui deve ser bem diferente, quando o Brasil inteiro – de Gado Bravo (PB) a Anta Gorda (RS), - estará disposto a assumir a paternidade da Olimpíada do Rio.



Estive cara a cara com a Tocha Olímpica e senti na pele o poder de sedução desse objeto que mora no imaginário de todo mundo. Como o anel do filme “O Senhor dos Anéis”, a Tocha é capaz de mudar a fisionomia até do mais blasé dos lordes. Não tem disfarce: a pessoa muda de atitude e levanta as sobrancelhas enquanto tenta colocar a mão nela. Rodamos 350 km, visitando várias cidades entre Glasgow e Inverness, na Escócia, e a história se repetiu em todo o trajeto.



A primeira parada foi Kilmarnock, uma cidadezinha pacata do interior da Escócia. O dia estava cinzento e frio, como deve ser sempre nos dias em que não chove. Fomos a um centro comunitário que foi o QG do revezamento na cidade. Apesar do clima cinza, a eletricidade lá dentro era grande. Lá estavam apenas os membros do LOCOG (London Organising Committee of the Olimpic and Paralympic Games), os cinco Condutores da Tocha, seus familiares e acompanhantes.



Uniformizados com o agasalho branco do COI (Comitê Olímpico Internacional), os condutores eram um menino cadeirante, um indiano de turbante, um senhor com poucos cabelos brancos, uma menina de uns 15 anos e um garoto com Síndrome de Down. Os cinco iriam se revezar pelo trecho que corta a cidade. Todos eram gente conhecida e escolhida pela comunidade, numa simpática eleição promovida pelo Lloyds Bank.



O ambiente, que misturava idiomas diferentes, ruídos de máquinas fotográficas e risos de excitação, ficou surdo e mudo quando um membro da organização apareceu com a Tocha Olímpica na mão. Ninguém reparou, mas foi um momento em que até os relógios pararam, ah, pode apostar que pararam. Nem o som da respiração das pessoas se ouvia. Foi somente o primeiro sinal do quanto esse objeto é poderoso.



Imediatamente, todos se aproximaram para tentar olhá-la de perto e, com sorte, conseguir tocar ou fazer uma foto.

Todos que quiseram conseguiram. E isso espalhou pela sala um perfume de felicidade irresistível.



Depois, a Tocha foi para a rua, onde era esperada por crianças de todas as escolas, moradores que não estavam trabalhando e gente que deu um perdido no serviço para ver o fogo passar. Foi um fuzuê. À moda de Kilmarnock, mas foi um fuzuê. Na sequência, vieram as ativações da Coca-Cola, da Samsung e do Scotish Bank, empresas que já haviam distribuído bandeiras, faixas, apitos, pandeiros e outros fazedores de barulho. Pronto. Kilmarnock já estava na Olimpíada. E, assim, cidade após cidade, a tocha foi engajando as pessoas no maior evento esportivo do mundo.



Quem teve o privilégio de conduzir a Tocha contou depois que a experiência é como se tornar uma espécie de para-raio, catalizador de todos os pensamentos, emoções e energias positivas. Dessas que a gente fica com a impressão de que ainda dá para mudar o mundo, sabe? Não é à toa: durante dois minutos e meio, cada um deles foi a única pessoa no planeta que teve nas mãos o objeto que é portador da mensagem mais ecumênica de fé na humanidade. Pode parecer meio piegas, mas não é. As pessoas ficam verdadeiramente tocadas.



Por isso, para os patrocinadores, a oportunidade de surfar nessa onda de corações abertos e almas desarmadas pode ser também uma grande armadilha. É preciso saber a dose certa entre ser uma companhia disposta a tornar o momento inesquecível na vida das pessoas e deixar algo também para o futuro ou mais uma marca invadindo a festa com mega logotipos e brindes inúteis que se acumulam no chão. A hora é de ter, mais do que a fórmula, a sensibilidade de se comunicar de maneira honesta com as pessoas e não simplesmente comprar um evento do qual elas já se sentem donas para fazer dele o quintal da sua marca.





Duda Hernández, Diretor de Criação da WMcCann


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