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Facebook e direitos civis

Relatório aponta falhas no combate à discriminação

08.07.20

Uma auditoria independente contratada pelo Facebook completou um trabalho de dois anos de avaliação das práticas e políticas da rede em relação a direitos civis. O resultado da análise, divulgado nesta quarta-feira, 08, aponta que a empresa tem falhado em combater a discriminação e o discurso de ódio em seu ambiente.

O trabalho, que ficou focado no Facebook apenas (não em suas demais propriedades) e no conteúdo limitado aos EUA, indica que houve medidas importantes adotadas pela rede, como a decisão de nomear um vice-presidente para conduzir os assuntos ligados a direitos civis, e a determinação em contratar mais líderes negros, aumentando em 30% a presença de profissionais pretos nos últimos cinco anos.

Mas esses movimentos não têm sido suficientes para responder às críticas feitas por mais de 100 organizações de direitos civis e justiça social que foram consultadas pela auditoria. Também foram ouvidos ativistas e representantes do Congresso americano, revela o documento, que tem 88 páginas.

Muitos na comunidade de direitos civis ficaram desanimados, frustrados e irritados após anos de envolvimento, em que imploraram à empresa que fizesse mais para promover a igualdade e combater a discriminação, além de proteger a liberdade de expressão”, escreveram as autoras do relatório, as advogadas Laura W. Murphy e Megan Cacace.

Na conclusão da auditoria, “Infelizmente, (...) a abordagem do Facebook aos direitos civis permanece muito reativa e fragmentada". Uma das críticas está na complacência com postagens de políticos em nome da liberdade de expressão – e isso ocorre enquanto o Twitter se tornou mais vigoroso com conteúdo que incite violência ou ódio ou propague informações errôneas, agindo contra o presidente americano Donald Trump (leia mais aqui). O assunto é espinhoso porque há eleições no país neste ano.

Outra crítica está no fato de os algoritmos da rede frequentemente falharem em captar o discurso de ódio. O Facebook falha ainda ao não perceber que "é frequentemente usado como ferramenta para orquestrar campanhas de assédio direcionadas a usuários e ativistas".

A auditoria advoga vigorosamente por mais ações do Facebook, destacando algumas questões que merecem atenção, embora haja muitas outras no relatório. Entre elas estão:

• Priorização mais visível e consistente dos direitos civis no processo de tomada de decisão da empresa.
• Mais recursos investidos para estudar e combater o ódio organizado contra muçulmanos, judeus e outros grupos na plataforma.
• Um compromisso de vetar conteúdo que vá além de banir conteúdo com referências explícitas de separatismo branco e nacionalismo branco; o aprimoramento das ferramentas deve proibir elogios, apoio e representações dessas ideias, mesmo quando os termos específicos não sejam usados.
Ações mais concretas e compromissos específicos que demonstrem que a empresa está atenta à discriminação.

O relatório completo pode ser acessado aqui.

Resposta da rede

Em texto assinado por Sheryl Sandberg, Chief Operating Officer (COO) da companhia, o Facebook classificou o trabalho da auditoria como "o começo da jornada", e não o fim. Para a empresa, segundo Sheryl, está cada vez mais claro que há um longo caminho a percorrer. “Por mais difícil que tenha sido expor nossas deficiências por especialistas, sem dúvida foi um processo realmente importante para nossa companhia".

Sheryl lembrou também do boicote que a rede está sofrendo por parte de anunciantes nos EUA e na Europa. “Quando concordamos em nos tornar a primeira empresa de mídia social a realizar uma auditoria desse tipo, com o incentivo da comunidade de direitos civis, ninguém sabia que o relatório final seria publicado em um momento em que a injustiça racial e a brutalidade policial estão levando milhões de pessoas para as ruas”, escreveu.

Também não tínhamos ideia de que ele seria publicado em um momento em que o próprio Facebook tem enfrentado fortes críticas de muitos membros da comunidade de direitos civis por causa de conteúdo de ódio em nossa plataforma e está sujeito a um boicote por vários anunciantes. Embora a auditoria tenha sido planejada e a maior parte realizada muito antes dos eventos recentes, seu lançamento não poderia ocorrer em um momento mais importante”, completou. Entre as empresas que suspenderam investimentos em publicidade na rede estão Coca-Cola, Starbucks e Diageo  - confira mais a respeito do boicote aqui.

Leia o texto de Sheryl na íntegra aqui.

Encontro com grupos do Stop Hate For Profit

Na véspera de o relatório ser publicado, grupos de direitos civis se reuniram com executivos da rede. O CEO Mark Zuckerberg e Sheryl estavam entre eles. Pelo lado dos ativistas, um dos participantes foi Derrick Johnson, presidente do NAACP (National Association for the Advancement of Colored People), uma das mais antigas e influentes entidades em favor das pessoas negras nos EUA e integrante do movimento Stop Hate For Profit.

A saída do encontro foi marcada por um tom de decepção por parte dos grupos. "Vimos a conversa se transformar em nada", declarou Johnson. “Eles não têm sensibilidade cultural para entender que sua plataforma está realmente sendo usada para causar danos. Ou eles entendem o dano que sua plataforma está causando e optaram por obter o lucro".

O comunicado do Facebook seguiu outra linha. "Essa reunião foi uma oportunidade para ouvirmos os organizadores da campanha e reafirmarmos nosso compromisso de combater o ódio em nossa plataforma”. A rede acrescenta saber que será julgada por suas ações, não por suas palavras.

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