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Festival do Clube 2018

O modo Forsman & Bodenfors de sobreviver ao sucesso

28.09.18

Dono de um estilo sereno e discreto, o sueco Björn Engström, redator e senior partner da Forsman & Bodenfors, talvez não se pareça com alguém que faça piada do trabalho, mas foi com humor fino que contou ao público do Festival do Clube de Criação como a agência se mantém firme a seus valores e como desenvolve projetos capazes de arrancar risos e provocar emoções mesmo quando o assunto é... caminhão.

Em 2014, a Forsman & Bodenfors teve um ano glorioso. Catapultada pelo sucesso viral da campanha “The Epic Split”, feita para a Volvo Caminhões, a agência conquistou o GP de Film (com o famoso vídeo protagonizado pelo ator Jean-Claude Van Damme), e mais 20 Leões no Cannes Lions. Mais do que isso: amealhou o título de Agência Independente do Ano do Festival.

Engström, que em seu currículo tem um Black Pencil no D&AD e o Best in Show no One Show, entre outros prêmios, revelou que, no começo, a agência rejeitou o pedido da empresa para trabalharem juntos. Era 2010 e eles sabiam que não entendiam nada de caminhões. Então, “educadamente” agradeceram o interesse e disseram “não” para eles. “Há outros lugares que podem fazer um trabalho B2B bem melhor para vocês”, alegaram os profissionais da F&B.

Mas a Volvo Caminhões não desistiu. E, tempos depois, voltou a bater na porta da agência, que declinou mais uma vez. Semanas mais tarde, no dia seguinte à festa de Natal da F&B, o cliente retornou para convencê-los a fazer uma campanha. “Depois da festa, não estávamos no nosso juízo perfeito. Então, aceitamos”, disse Engström, fazendo piada da própria agência. Havia um fato novo, porém. A empresa tinha mudado de postura. Estava para lançar novos modelos e não queria um trabalho convencional B2B. E isso foi o que permitiu à agência desenvolver diversos projetos que viralizaram.

Como a agência não entendia nada de caminhões, os profissionais da F&B trataram de se preparar para atender o cliente. Foram aos grandes compradores (entre eles, companhias como Carlsberg) e pesquisaram também os “lonely guys”. Ou seja, os caminhoneiros. Era preciso falar com todos os públicos, mas sem ter um grande orçamento.

A estratégia foi causar burburinho com algo que realmente surpreendesse e pudesse ser bastante compartilhado. E assim criaram a série Volvo Trucks Live Test. A cada novo vídeo, um aspecto técnico diferente dos novos caminhões era mostrado. O primeiro deles trouxe uma campeã mundial de slackline (esporte de equilíbrio sobre uma fita elástica). Ela andou sobre um slackline enquanto dois caminhões se moviam numa estrada da Croácia. “Não foi fake. Eu estava lá”, comentou Engström.

O filme arrebatou os consumidores e foi comentado em diversos textos da imprensa. Outro vídeo da série consistiu em mostrar um caminhão passar por cima da cabeça de um técnico da empresa, enterrado até o pescoço no chão e equipado apenas com um capacete. A ousadia dos testes continuou a gerar views e mídia. Na Espanha, no caminho tortuoso de uma pedreira, foi rodado um filme com um caminhão que foi basicamente conduzido por um hamster – um motorista fazia o animal andar de uma direção para outra conforme movia uma cenoura.

Se um roedor pode determinar a direção do volante, por que uma criança não poderia dirigir um? Esse foi mais um teste ao vivo do Volvo Trucks. Sophie, a garota de quatro anos, usou um controle remoto para fazer um test-drive de um modelo robusto em uma pista cheia de obstáculos. Ela manobrou o veículo na segurança de uma plataforma e com câmeras instaladas em vários locais, inclusive num drone, para acompanhar o teste da garota. O resultado? Cenas desastrosas, um caminhão que resistiu a trombadas e uma queda e mais de 16 milhões de views no YouTube.

Melhor que esse total de visualizações só mesmo o espacate de Jean-Claude Van Damme, que superou 89 milhões de views. A agência esperava que houvesse uma boa repercussão, mas não imaginava a extensão, com a geração de diversas versões que se espalharam pela internet. “Foi uma loucura. Grandes veículos como o Guardian nos procuraram”, lembrou Engström.

E depois, o que vem?

O redator da F&B confessou que passou várias noites sem dormir diante do sucesso global da campanha e das premiações. “Discutimos pouco sobre como sobreviver a um sucesso. Falamos muito do fracasso”, disse. Mas e quando se trata de algo tão bom... o que vem depois? “Tivemos a ajuda de alguns amigos para superar isso”, completou. Essa ajuda pode ser compreendida pelo refrão da música “Get Back”, dos Beatles. “Get back to where you once belonged”.

E foi isso que fizeram, afirmou Engström. “Voltamos ao nosso time. Voltamos ao trabalho normal e não nos permitimos cair na fantasia”. A campanha com a pequena Sophie veio depois de “The Epic Split”. Além do impacto na mídia social, a ação rendeu mais de 10 mil artigos na imprensa. “Não vá atrás de mega hits todo o tempo, mas de uma sequência de sucessos”, aconselhou o criativo. Nesse período, o market share da Volvo passou de 14% para 17%.

Modelo da agência

Engström ressaltou as características da agência para garantir a qualidade criativa do que fazem. Ele contou que não existe um departamento separado de estratégia na F&B. Planejadores trabalham lado a lado com criativos. Outro ponto importante é que não há chefes de criação. Em outras palavras, o chefe é o time inteiro de criação (leia mais detalhes sobre esse modelo na entrevista que visamos antes com o redator - aqui).

Assim, todos têm de conhecer profundamente o cliente e entender suas necessidades de comunicação e suas demandas estratégicas. Quando apresentam um projeto, a equipe responde por tudo. “O chefe que temos é o trabalho em si”, reforçou. Esse conceito visa aumentar a colaboração. Como Engström pontuou: “neandertais competem, homo sapiens colaboram”.

Há mais um aspecto que Engström levou ao painel: “encorajamos as pessoas em outras coisas além da publicidade”. Um projeto que surgiu a partir desse posicionamento foi uma ação feita com o jogador sueco Zlatan Ibrahimovic, que exibiu uma tatuagem enigmática em seu perfil no Instagram, em 2015, pouco antes de um jogo. Na partida entre o Paris Saint-German e o Caen, ao fazer um gol, o atacante tirou a camisa e mostrou seu corpo repleto de outras tatuagens. Depois, revelou que eram nomes que representavam as mais de 800 milhões de pessoas que passam fome no mundo. Era uma campanha criada para o World Food Programme, instituição da ONU.

Empresa global

Recentemente, a Forsman & Bodenfors e a KBS fizeram um acordo de fusão para formar uma nova estrutura global, sob o nome da agência sueca. Com o negócio, a F&B passa a contar com 700 funcionários e mais um escritório central, o de Nova York. Desse modo, a agência pretende conquistar mais clientes com base na oferta de criatividade comprovada pelos prêmios e no trabalho de analytics e perfil tecnológico dos novos parceiros. “Vamos tentar exportar nosso modelo de trabalho, que é mais barato e mais eficiente”, salientou Engström.

Lena Castellón

 

Fotos - Miguel Schincariol

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