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Mulheres do áudio – Parte 4

Janecy Nascimento, Loud+

12.03.24

No Dia Internacional da Mulher, o Clubeonline lançou uma série feita com mulheres que criam e/ou produzem áudio no mercado publicitário.

Um número que historicamente sempre foi diminuto, mas que agora começa a ganhar musculatura e crescer. Que bom!

A primeira entrevistada foi Gil Viana, CEO da Mugshot. A segunda, Mônica Agena, produtora musical da Mr. Pink.

A terceira conversa foi com Elga Bottini, compositora e produtora musical da Capta. E agora é a vez de Janecy Nascimento, maestrina, sócia-fundadora e CEO da Loud+.

Clubeonline - Conte brevemente como surgiu sua história com a música.

Janecy Nascimento - Eu nasci em uma família muito musical. Passei a infância ouvindo todo tipo de música. Desde muito cedo estudei música. Primeiro piano, depois violão e, então, flauta. Resolvi fazer faculdade de composição e regência quando estudei violoncelo. Iniciei minha carreira como violoncelista de orquestra sinfônica e me animei quando surgiu a oportunidade de reger um coral. Depois comecei a dar aulas de música, orquestra e coral em uma escola Waldorf. Foi quando aprendi muito sobre orquestração e escrever arranjos, pois contávamos com instrumentistas de diferentes níveis técnicos e os arranjos precisavam atender as suas capacidades. Em paralelo, fazia trilha sonora para teatro. Foi assim que passei a me interessar por música sincronizada a imagem. Tudo isso acontecia ao mesmo tempo que eu criava/ amava/ educava (e tudo o mais que cabe na maternidade) um casal de filhos. Talvez pela parceria, eles sempre estiveram muito próximos da minha atividade profissional. Quando eles estudavam instrumentos, ou montavam uma banda, lá estava eu arrumando cabo, transpondo cifras, comprando os instrumentos. Quando eu tinha os meus projetos, lá estavam eles tocando uma flauta, bateria, cantando… Posso dizer que a música nos ajudou a ter sempre assunto e interesses em comum. A escola Waldorf me abriu uma janela para a questão psicoacústica. Me interessei por musicoterapia e, depois, fiz pós-graduação em psicanálise. O poder que a música tem sobre a saúde e os humores me encanta demais.

Clubeonline - Como começou a produzir para o mercado publicitário?

Janecy - Há 20 anos resolvi abrir uma produtora, hoje a Loud+, com um ex-sócio. Assim, comecei minha carreira na publicidade. Eu realmente me encontrei fazendo trilha sonora para filmes. Por anos, para filmes publicitários. Nos últimos anos estou cada vez mais dedicada aos longas, séries e documentários. Hoje, a Loud+ é uma das maiores produtoras de áudio de SP, e me sinto muito realizada em trabalhar exatamente com o que eu quero e, principalmente, com quem eu quero. É bom demais!

Clubeonline - Passou ou passa por dificuldades, envolvendo por exemplo preconceito, neste universo?

Janecy - Sim, muito. Quase todos os dias. Para começar, quem conhece uma maestrina? Todos conhecem e aprovam um maestro. O espaço está se abrindo aos poucos, como para outras minorias. Fala-se muito sobre isso, criam-se narrativas, discursos politicamente corretos. Mas no dia a dia, nos processos, nas entrelinhas, a realidade ainda esta longe de representar as frases de efeito. A credibilidade que uma mulher tem como criadora de trilha sonora ainda é muito inferior à de um homem

Clubeonline - Você sente que ainda há poucas mulheres sendo reconhecidas e criando nas produtoras de áudio ou acredita que hoje este cenário mudou?

Janecy - Dentro da Loud+ as mulheres têm uma força incomum. Mas fora, as coisas ainda não são bem assim. A real é que desde criança as meninas ganham presentes de “cuidadoras” como bonecas e panelinhas. Mas os brinquedos que instigam a criatividade, o pensamento lógico e científico, são reservados aos meninos. Isso está mudando. Eu tive a sorte de ter sido presenteada com instrumentos musicais desde muito cedo. Além disso, por exemplo, um homem que deixa escapar um “arroto” numa PPM é “bem louco”, “fora da caixinha”, entre outros adjetivos. Uma mulher não seria perdoada. O cenário tende a mudar, mas vai demorar pois estamos falando da questão da formação de profissionais mulheres. Isso não acontece do dia para a noite. As meninas precisam acreditar que podem ter essa profissão e investir nela. Há muitas DJs mulheres já, por exemplo. Mas, produtoras, ainda existe um vácuo. Na publicidade, sempre tive espaço como a visão feminina, o que significava basicamente sensibilidade, sutileza, delicadeza, orquestrais. Hoje já sinto que a representação da mulher acontece através da força, da luta, da garra, da ocupação do seu lugar. Essa é uma quebra de paradigma. As pessoas não me pedem uma música fofinha. Pedem vibração, força. E estou lá para representar essa mulher nos produtos dirigidos ao público feminino.É uma luta e fico muito orgulhosa quando me vejo lado a lado com outras mulheres, fazendo a mudança, batendo pesado e com coragem, conquistando o que deveria ser possível para qualquer pessoa.

Clubeonline - Dos seus trabalhos feitos para propaganda, quais  você destacaria? Por quê?

Janecy - Tenho feito alguns filmes de Natura com a Galeria. É um oásis! Muitas mulheres poderosas, inteligentes, respeitosas. Um sonho de consumo. Cada PPM, cada reunião de briefing, me dá a certeza de que estamos todas no caminho certo. Em 20 anos de Loud+ também fiz muito trabalho para C&A, Oi, Riachuelo, Renner, Claro, Dove, Pantene, entre outras marcas.

Clubeonline - Fora do universo da publicidade, o que te move? Você está em outros projetos que envolvem música?

Janecy - Fiz filmes e séries como “Amarelo – É Tudo Pra Ontem” (de Emicida e Fred Ouro Preto), “PCC - Poder Secreto”, “Olhar indiscreto”, “Beijo adolescente”, “As seguidoras”. Acabei de fazer dois longas com o Bruno Barreto: “Vovó Ninja” e “Férias Trocadas”. Acabei de fechar o “Amizade Colorida” na versão brasileira, dirigida por Rafael Gomes. Fiz a direção musical da sala Portal Cósmico, do Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro, com trilha sonora assinada pelos maestros da Loud+. Estou agora no meio da produção de um documentário que ainda será anunciado. Entre tantos trabalhos, tenho muita clareza da força que nos move, do talento infindável que todas temos para botar em jogo. E esse espaço que estamos dia a dia ocupando mais e mais, não vai nos levar para a fogueira. Não mais.

Mulheres do áudio – Parte 4

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