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What Design Can Do

O design pode combater a violência ou salvar a democracia?

16.12.16

Design não é simplesmente desenhar. É provocar reflexões. Esse pensamento se concretizou durante os dois dias do evento What Design Can Do, uma conferência internacional que aconteceu, pela segunda vez, em São Paulo. Realizada na FAAP entre a terça-feira 13 e a quarta 14, a série de palestras e atividades abordou alguns temas que, em tese, não parecem ter conexões diretas com a disciplina. O que dizer, por exemplo, da crise de refugiados e da violência contra a mulher? E quanto à bolha de informações em que vivemos e que construímos com base em algoritmos?

No programa do evento, as palavras de Richard van der Laken, diretor criativo do WDCD, dão o tom desse pensamento. Como ser “um catalisador em um momento em que a autenticidade é o que mais importa”? A resposta não é simples, mas é possível. A saída está em utilizar as ferramentas do design para que ele “seja agente fundamental da mudança nessa busca por soluções compartilhadas, alternativas e novos insights sobre os problemas reais que as pessoas enfrentam”.

Neste ano, o WDCD lançou o desafio de estimular a comunidade criativa a propor projetos que enfrentassem a crise de refugiados. Ao todo, 631 ideias de 70 países foram inscritas no concurso, que teve apoio da Ikea Foundation. Um júri internacional selecionou cinco propostas, que foram premiadas. O primeiro lugar foi para um projeto chamado Agrishelter, de construção de abrigos com elementos sustentáveis (confira o vídeo mais abaixo). “Estamos mobilizando a comunidade criativa para questões sociais urgentes. Temos de fazer algo. Esse é um ponto inicial”, reforçou Laken, no evento.

Levar mentes criativas a pensar e desenvolver propostas é um dos caminhos do design thinking. Outro tema debatido e exercitado foi o da violência contra a mulher. Esse é um assunto que se transformará em mais um desafio do WDCD, na linha do que foi feito em relação aos refugiados. Segundo a organização do evento, 75% das mulheres são alvo de alguma violência física ou sexual durante suas vidas.

Uma das sessões especiais, por meio do design thinking, fez com que os participantes aprofundassem o tema, montando um mapa de cenários críticos e possíveis soluções. Um dos palestrantes, o promotor público holandês Martin Witteveen, especializado em crimes contra a mulher, apontou que é preciso também prestar atenção à exploração no mercado de trabalho. Em países em desenvolvimento, por exemplo, é comum que a indústria têxtil e de moda utilize mão de obra feminina que recebe pagamentos baixos, apesar de frequentemente cumprirem jornadas abusivas. “Compramos roupas baratas produzidas pela exploração do trabalho. Nós nos tornamos parte desse problema. Precisamos refletir sobre isso e cobrar a responsabilidade das empresas”, afirmou.

Mais borogodó

CEO da Tátil, Fred Gelli se apresentou no WDCD falando que o design é um ofício para fazer novas conexões.       “Ninguém mais vai conseguir resolver problemas sozinho”, disse. Ele lembrou que neste ano o Brasil teve a oportunidade de mostrar sua força criativa por meio dos projetos olímpico e paralímpico. Por conta de seu envolvimento com a criação da marca olímpica e da criação da cerimônia de abertura dos Jogos Paralímpicos, Gelli rodou o mundo para compartilhar a experiência na Rio 2016.

Criamos uma ferramenta estratégica que garantiu a integração da comunicação”, observou, salientando a importância de termos mais soluções integradas. Mas, mais do que isso, a marca da Rio 2016 promoveu uma integração dos brasileiros, antes descrentes quanto ao sucesso da abertura e do evento. “Quanto vale mudar a auto-estima de um país”, perguntou Gelli.

Uma das palavras que o CEO da Tátil destaca nessas palestras é “borogodó”. Esse foi o termo escolhido por ele para abordar o resultado da mistura de povos e culturas que formam o brasileiro. “Devíamos tirar partido de ter essa característica. Mistura é sinônimo de riqueza. A natureza não gosta de monotonia”, comparou. Gelli defendeu que parte do nosso borogodó vem do convívio com uma natureza muito diversa. Ele acrescentou que o brasileiro sabe fazer muito com pouco.Temos de transformar a areia em castelo”.

Design interativo e data revolution

Designer que atua sozinho em seu estúdio em Amsterdã, mas que se engaja em projetos colaborativos, Rogier Klomp é especializado em documentários animados e infográficos. Um de seus trabalhos é Big Data: the shell search, documentário feito com o diretor Shuchen Tan, que mostra o potencial do design no jornalismo de dados. Ele também dá aulas de data design e está com um novo projeto, a pesquisa Can Data Save Democracy.

É preciso entender o big data. Trabalho para explicar temas abstratos e complexos. Basicamente tenho de entender como as coisas funcionam”, contou, salientando que seu foco está no design, na tecnologia e no jornalismo. Klomp afirmou que vivemos uma “data revolution. Em 2003 havia cerca de 5 exabytes de dados (o equivalente a 1024 petabytes. Um petabyte corresponde a 1024 terabytes). Em 2013, 5 exabytes eram gerados por dia. Neste ano, aproximadamente 5 exabytes podem ser produzidos em uma hora.

Sobre o mundo, após a eleição de Donald Trump e a vitória do Brexit, Klomp concluiu que a democracia não está indo muito bem. Evidentemente, há muitos outros problemas que levantam essa questão. Por isso, o designer se perguntou se a democracia não estaria se tornando disfuncional. Como ele argumenta na página que criou no Facebook, democracia depende de cidadãos bem informados. O problema é que as pessoas não têm recebido informações tão fidedignas, algo para que o próprio Facebook despertou.

Está mais difícil discernir o que é verdade e o é falso, o que é fato e o que é opinião. Nas redes sociais, os algoritmos determinam o que chega ao usuário, pela navegação desse mesmo usuário. Por outro lado, o conceito de smart cities se expande. Isso quer dizer que dados podem ser usados para melhorar a vida nas cidades. Mas e quando governos decidem utilizar as informações geradas para determinar benefícios (ou não)? Klomp ponderou que na China, por volta de 2020, estará ativo um sistema de crédito social em que a população será avaliada. Entram nesses critérios não apenas o lado financeiro, mas inclusive o comportamental. Essas questões permeiam toda a pesquisa do Can Data Save Democracy. No Facebook, as pessoas podem se manifestar sobre esse assunto e buscar soluções para que o uso do big data promova atitudes mais democráticas.

 

Por Lena Castellón

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